terça-feira, 29 de setembro de 2015

A Verdadeira Maioria


Estamos na semana em que tudo se decide. PS e PSD/CDS encontram-se taco a taco, dando neste momento tudo por tudo para serem a força política mais votada no próximo Domingo. A avalanche de sondagens mostra-nos que nada é certo e o Governo que teremos no pós-4 de Outubro é, neste momento, uma incógnita. No entanto, se olharmos bem para os resultados das sondagens, elas conseguem também mostrar uma realidade bastante diferente. A soma dos resultados das forças políticas à esquerda totaliza cerca de dois terços dos votos. Repito: dois terços dos votos. Com uma esquerda tão claramente maioritária, como é possível estarmos num cenário de taco a taco?

Assim acontece porque, em 40 anos de democracia, a esquerda política em Portugal nunca se conseguiu entender para governar o país. Razões históricas, que remontam ao tempo do PREC, explicam bem as raízes do referido desentendimento que teima em não ser ultrapassado. O centrismo excessivo do PS, a ortodoxia ideológica do PCP, a relutância do Bloco em assumir funções executivas e a fragmentação do restante cenário na esquerda radical têm vindo a manter aberta uma fratura que prejudica a qualidade da nossa democracia. Portugal é, nestes domínios, um caso bastante atípico quando comparado com os restantes países europeus, onde os entendimentos à esquerda são comuns.

Independentemente da atribuição de responsabilidades sobre este fracasso político (cada cabeça terá a sua sentença), importa acima de tudo que exista real vontade em ultrapassá-lo. E tal só é possível existindo disponibilidade para dialogar, para procurar pontes e verificar de facto possibilidades de entendimentos. Sem preconceitos, sem ultimatos, centrando-se no presente e no futuro. Se é consensual entre a esquerda que o país precisa de uma mudança, importa trabalhar para a tornar possível. Importa que cada força política e cada actor político saia de facto da sua confortável trincheira e se disponibilize a negociar seriamente, a procurar entendimentos alcançáveis.

Se perguntarmos ao eleitorado das diversas forças políticas à esquerda a sua opinião sobre a necessidade de entendimentos à esquerda, é certo que a resposta seria maioritariamente positiva. O referido eleitorado, apesar de bastante heterogéneo, prefere um governo suportado por uma maioria de esquerda ou com entendimentos à esquerda, do que um Governo do PS minoritário ou assente em acordos com a direita. Prefere também evidentemente um Governo de esquerda à continuação do atual Governo.

A materialização de um Governo à esquerda pode materializar-se de formas diversas. Um cenário de coligação pós-eleitoral seria o mais evidente, conseguindo-se um Governo com várias forças políticas. Mas, não sendo este possível, os acordos de incidência parlamentar poderiam também ser suficientes para suportar e garantir estabilidade a um Governo durante a próxima legislatura. Soluções não faltam, importa agora garantir que existe vontade. E importa que os atores políticos à esquerda se sintam de facto pressionados pelo seu eleitorado a procurar os referidos entendimentos.

Uma sincera vontade de ultrapassar este tipo de bloqueio histórico à esquerda foi uma das principais razões que me levaram a aderir e ser candidato pelo LIVRE/TEMPO DE AVANÇAR. A disponibilidade para fazer parte de uma solução governativa e a real determinação em busca de pontes e compromissos entre a esquerda política são traços que caracterizam desde logo esta candidatura cidadã. 

O voto em qualquer força política à esquerda será útil para promover a mudança que o país precisa no momento actual. Não haja dúvidas a este respeito. O voto no LIVRE/TEMPO DE AVANÇAR é a garantia de empenho total na construção da maioria de esquerda que há 40 anos escapa ao país.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Administração Pública centrada nos Cidadãos


O setor público é um conjunto de vários mundos. Um pequeno universo, no fundo. Se tivermos apenas em conta a Administração Pública Central, contabilizamos centenas de entidades que cobrem as mais diversas áreas de política pública. Do ambiente à educação, da administração interna à segurança social, dos transportes à justiça ou aos assuntos fiscais, o universo público chega às mais diversas esferas sociais. É, por isso, uma máquina grande, complexa e diversa. Institutos, Agências, Direções-Gerais, Fundações, Inspeções, terminologias que o cidadão habituou-se a ouvir, mas que na maior parte das vezes nem sabe bem qual a diferença. 

A referida diversidade cria no entanto algumas dificuldades cimeiras. Uma vez que os cidadãos não dominam a máquina do Estado e a constelação de entidades que a compõem, facilmente são levados a olhar para a Administração Pública como algo demasiado complexo, inatingível e naturalmente burocrático. Por outro lado, a diversidade de mundos no seio do Estado leva a que este, por vezes, se comporte perante os cidadãos de forma segmentada e pouco coerente entre si. Cada ministério, cada entidade, tem os seus procedimentos, os seus meios, a sua forma de prestar serviços ao cidadão. 

Dois caminhos assumem assim natural destaque para tornar a Administração Pública mais centrada nos cidadãos: 

1. Coerência e Integração na Prestação de Serviços 
A prestação de serviços ao cidadão não deve ser o reflexo do modo como a Administração se organiza internamente. Na verdade, o cidadão deverá estar pouco preocupado se o serviço que lhe é prestado provém, por exemplo, do Instituto da Mobilidade e dos Transportes ou do Instituto dos Registos e do Notariado. Isso é-lhe pouco relevante, estando sim interessado em que o serviço lhe seja efectivamente prestado de forma simples e eficaz. Deverão assim desenvolver-se formas cada vez mais coerentes e estandardizadas de relacionamento com o cidadão, independentemente de se tratar de um serviço prestado pela entidade A ou B. As Lojas do Cidadão são bons exemplos deste esforço de integração e coerência na prestação de serviços públicos. 

2. Interoperabilidade e Troca de Informação
Faz hoje pouco sentido que a Administração Pública esteja constantemente a pedir a mesma informação aos cidadãos. Por exemplo, porque estamos sempre a responder quem é o nosso pai e a nossa mãe, onde nascemos e quando nascemos? Porque estão-nos constantemente a pedir a declaração de rendimentos, se as Finanças possuem já a referida informação? A Administração Pública deve estar hoje cada vez mais interligada, permitindo deste modo desburocratizar o relacionamento com os cidadãos. Garantindo-se a interoperabilidade dos seus sistemas de informação, estes poderão assim melhor comunicar e trocar informação entre si, libertando deste modo o cidadão, sob a sua autorização, de constantemente prestar a mesma informação aos serviços públicos. O pré-preenchimento das Declarações de IRS ou o Serviço de Alteração de Morada são bons exemplos dos esforços atuais de troca de dados.

Em suma, a diversidade no seio da Administração Pública é inerente à abrangência da sua missão nas mais diversas esferas sociais. Deve até ser assumida como uma riqueza de saberes, de experiências e até de culturas de funcionamento. Compete, no entanto, à modernização administrativa garantir que a referida diversidade é acompanhada de uma política que coloque verdadeiramente o cidadão no centro, agilizando o seu relacionamento com a Administração Pública e transformando a diversidade do Estado em simplicidade.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Transparência na Administração Pública


Se tivermos de apontar o setor do nosso país que mais informação detém ou produz, a Administração Pública surge naturalmente de forma destacada. Do ambiente ao sistema de ensino, da saúde à segurança social, das atividades económicas à administração interna, o setor público é, de facto, uma gigantesca máquina de recolha, tratamento e gestão de informação. E esta pode ser de tipo diverso, desde estatísticas a dados de gestão, informação geográfica a dados pessoais. Um manancial de informação impressionante, de uma riqueza extraordinária, permitindo caracterizar a realidade dos mais diversos sectores.

Mas calma. Este não é um daqueles artigos que visa alertar os cidadãos para a quantidade de informação que as agências governamentais detêm sobre nós, ameaçando a nossa privacidade. Centremo-nos agora no valor que a informação do setor público tem e como pode ser melhor gerida. De todo este tremendo manancial de informação detido pelo Estado, apenas uma muito pequena percentagem é devolvida à sociedade civil, através de websites, arquivos públicos ou outros centros de recursos.

Deste modo, tendo em conta todas as potencialidades trazidas pela era do digital na disponibilização estruturada de informação, porque razão a abertura tem vindo a processar-se de forma tão lenta? Porque não poderemos assumir que toda a informação do setor público deve ser pública e facilmente acessível por defeito? Exceptuando naturalmente os dados pessoais e informação crítica em termos de segurança, não existem razões de fundo para que o Estado continue a ser “fechado por defeito”.

Precisamente tendo presente o racional acima, as teorias da Administração Pública Aberta (Open Government) têm vindo a ganhar um relevo crescente nos últimos anos. Assume-se a transparência do setor público como uma grande mais-valia no combate à corrupção ou à discricionariedade do Estado, mas também como um instrumento de impulso à qualidade dos serviços públicos. Se a Administração é transparente na sua actividade, nos seus processos, nos dados que detém, passa a poder ser muito melhor acompanhada e monitorizada pelos cidadãos, cujo nível de exigência não pára de aumentar. A Administração terá assim incentivos crescentes para melhorar a sua actividade, o seu modo de funcionamento, a sua necessidade de responder de forma eficiente e eficaz às necessidades dos cidadãos.

A transparência por defeito é também uma mais-valia no envolvimento da sociedade civil, garantindo que esta possa melhor influenciar ou mesmo complementar a gestão pública. Por exemplo, possibilitando que as Universidades consigam melhor utilizar o manancial de informação detido pela Administração Pública. Ou permitindo mesmo que outros atores (associações, pequenas empresas ou mesmo cidadãos) possam reutilizar os referidos recursos com fins públicos diversos. Inúmeras boas práticas existem no desenvolvimento de aplicações para smartphones ou tablets baseadas em informação pública. A transparência assume-se assim também como geradora de pegada económica, uma vez que novos modelos de negócio podem emergir com a utilização de dados abertos.

Em suma, as vantagens de se assumir a “transparência por defeito” na Administração Pública são inúmeras e os meios hoje disponibilizados pelas Tecnologias da Informação e da Comunicação permitem facilmente colocar este tipo de orientação em prática. Importa sim mudar rapidamente as mentalidades dos atores públicos, nomeadamente dos responsáveis políticos, para este novo tipo de realidade. Uma cultura de transparência exige uma muito maior responsabilidade dos atores públicos, é certo. Ora aí está uma excelente “desculpa” para ser rapidamente abraçada.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
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