2010 ficará rotulado como o ano da crise, parecem existir poucas dúvidas a este respeito. Será lembrado como um ano de má memória. O ano em que a Europa se viu à mercê da confiança e estabilidade emocional dessa estranha entidade conhecida como “mercados”. Para os portugueses, 2010 será recordado como o ano dos PECs, o ano em que um pacote de austeridade sem precedentes foi decretado, o ano em que muitas famílias perceberam que o dia de amanhã em termos de condições de vida poderá não ser melhor do que o dia de hoje. Posto isto, como será 2011? O que se segue a este 2010 de má memória? Os exercícios de futurologia possuem naturalmente o valor que lhes quisermos atribuir. O traçar de cenários prospectivos vale o que vale. Mas não deixam de ser exercícios interessantes de realizar.
Em termos económicos, tudo leva a crer que a crise está cá para ficar. Aliás, uma vez que muitas medidas de austeridade só terão início em Janeiro, constatamos facilmente que os efeitos da crise económica em curso ainda não se estão a fazer sentir em pleno. O crescimento previsto para o próximo ano não é animador e é muito pouco previsível que os índices de confiança melhorem significativamente. O desemprego deverá continuar a crescer, assim como o custo de vida. Aliás nestes domínios, a subida do IVA e das taxas de juro no crédito à habitação são ingredientes explosivos para a diminuição do rendimento disponível dos agregados familiares. Em suma, as expectativas económicas para 2011 são muito pouco animadoras.
A nível de politica nacional, sérias mudanças adivinham-se. A crer nas actuais sondagens, Cavaco Silva será reeleito, somando assim mais 5 anos na sua estadia por São Bento. Por seu turno, tudo parece indicar que o actual Governo cairá no limite até à aprovação do próximo Orçamento de Estado. Passos Coelho será então eleito, adivinhando-se que tal possa significar para o PSD o regresso às longas temporadas no poder. Possivelmente tal acontecerá até em coligação com o CDS, concretizando-se assim os sinais que vêm sendo dados pelos líderes dos dois partidos. Revigorar-se-á o panorama do centro-direita em Portugal. concretizando-se aliás o famoso sonho de Sá Carneiro: “um presidente, uma maioria, um governo”.
O PS voltará, por seu turno, para a oposição. Ausente de São Bento e de Belém, perspectiva-se uma significativa travessia no deserto. O partido tenderá então a eleger uma direcção mais à esquerda. Procurará deste modo saciar a sede de ideologia de que tem padecido nos últimos anos. Tal nova liderança dificilmente se constituirá como uma série alternativa ao novo governo do PSD. Cumprirá sim um objectivo bem mais concreto de conseguir que o partido se reencontre depois de uma longa estadia no poder.
A futurologia, ou se quisermos ser um pouco mais científicos, os cenários prospectivos, são traçados à luz do que hoje conseguimos vislumbrar. Assentam portanto na previsibilidade dos acontecimentos. Ora, se há coisa que sabemos à partida é que, embora algumas tendências na evolução dos acontecimentos possam ser facilmente identificáveis, a previsibilidade em termos políticos é um bem raro. Um qualquer acontecimento amanhã, um qualquer caso ou gafe cometida podem facilmente alterar o rumo que parecia inevitável. O fenómeno político em democracia é demasiado mutável para poder rimar com fatalismos. Eis uma máxima adequada ao início de um novo ano: nada está decidido, tudo continua por decidir. Se queremos ou não participar no rumo dos acontecimentos, tal já constitui uma questão que cada um de nós se deve colocar.