terça-feira, 6 de agosto de 2013

O Gangue


O BPN era uma espécie de clube. Um clube de alta sociedade, melhor dizendo, com muita gente lá metida, muita gente a lá fazer os seus grandes negócios. Ricos, novos ricos, remediados, gente mais ou menos famosa dos mais diversos setores por lá andava. E tudo corria bem, a fartura dava de comer a muitos e o banco era visto como mais um bom exemplo do espirito empreendedor dos anos noventa. Era mais um dos símbolos de um Portugal cheio de oportunidades, paraíso para os espíritos mais arrojados e descomplexados, onde era norma investir-se 1 e colher-se 5. 

No entanto, quando se descobriu o buracão BPN, as falcatruas que encobria e o quanto o erário público teria de desembolsar, subitamente parece que o clube nunca existiu. Melhor dizendo, sabe-se que existiu, mas parece que afinal tinha apenas dois ou três grandes frequentadores. Oliveira e Costa e Dias Loureiro é que foram os grandes responsáveis de tudo o que aconteceu. Todos os restantes não sabiam de nada, coitados. Gente honesta e distraída que por lá passou, fez uns troquitos e mais nada.

O exemplo de Rui Machete, o ministro retirado do baú cavaquista, é bastante paradigmático a este respeito. O ilustre senhor a quem foi concedida a honra (e o proveito financeiro, claro) de presidir à Assembleia Geral da Sociedade Lusa de Negócios (SLN) gosta pouco de recordar esses momentos. Até os omite no seu currículo e tudo. É sempre interessante aliás ver um ex-presidente da Assembleia Geral da SLN a indignar-se com a “podridão dos hábitos políticos” quando alguém tem o desplante de lhe recordar esta sua estreita ligação ao grupo de Oliveira e Costa.

Curiosamente, não só Machete esteve estreitamente ligado à SLN, como foi mais um dos beneficiados das gloriosas vendas de ações da SLN ao BPN, com lucros de 150%. A operação de Machete foi em tudo semelhante ao caso ocorrido com Cavaco Silva e a sua filha, que entre 2001 e 2003 compraram ações que venderam 2 anos depois com lucros também na ordem dos 150%, e que resultou num ganho para a família Cavaco Silva de 350 mil euros. Esta venda de ações da sociedade do amigo Oliveira e Costa ao banco do amigo Oliveira e Costa revela-se de facto muito proveitosa. 

Sejamos claros: o BPN é com certeza o maior crime financeiro ocorrido no Portugal democrático. Um buraco de milhares de milhões de euros que teve de ser coberto pelo dinheiro dos contribuintes. E que ainda hoje continua a fazer grande moça, uma vez que com frequência vamos sabendo que mais uma tranche de milhões do orçamento de Estado foi transferida para cobrir o buraco. E o BPN não foi um banco qualquer. Toda a gente sabia que era gerido por uma série de figuras dos governos PSD de Cavaco Silva. O próprio Cavaco Silva continua a ter muito que esclarecer a este respeito, uma vez entre gloriosas compras e vendas de ações e permutas de casas velhinhas com mansões na Aldeia da Coelha, a sua proximidade ao grupo SLN é hoje indiscutível. 

A conversa sobre as ligações obscuras entre a política e os grandes grupos económicos parece sempre saída de uma qualquer cassete que, concordemos ou não, ficámos um pouco fartos de ouvir. Mas se há casos em que tal expressão faz sentido, este caso é o BPN. Recordar o BPN reflete a podridão da política? Não podíamos estar mais de acordo! O BPN foi de facto uma podridão, por isso o gangue que a ele esteve associado devia, no mínimo, ter a hombridade de se calar e afastar-se do exercício de cargos públicos. Rui Machete fez parte do gangue? Não faço ideia. Foi amigo ou esteve muito próximo do gangue? Julgo que não existem dúvidas a este respeito.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental

domingo, 4 de agosto de 2013

Piadas de mau gosto

Durante esta semana, Ana Drago referiu-se ao Governo como um “grupo de destroços”. Da Ministra das Finanças, que denota ter uma relação atormentada com a verdade, ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, saído do bolorento baú cavaquista, o nível de descredibilidade atingido por cada um dos membros do Executivo leva-nos a pensar que estamos diante de uma brincadeira de muito mau gosto. Mas qualquer que seja o prisma que olhemos, o delírio a que chegámos é sempre ofuscado por uma figura que se destaca: Paulo Portas. Quando achávamos que já tinhamos visto tudo do Paulo, que o seu contorcionismo já tinha batido todos os recordes, este nosso Ronaldo da ginastica política consegue sempre surpreender-nos.

Numa primeira fase, ficámos incrédulos com a “irrevogabilidade fléxivel” de Portas. Num momento estava a bater com a porta, assegurando não ter condições para continuar. No momento seguinte estava alegremente a aceitar o cargo de vice-primeiro-ministro, esta figura governativa estranha que agora teremos de nos habituar. 

Depois, ficámos boquiabertos com o reforço dos lugares do Governo atribuidos ao Paulo e aos seus seguidores. Os ânimos do CDS acalmaram-se assim que se abriram os cordões da bolsa de assentos governamentais. De repente o Governo ficou refém do pequeno parceiro da coligação, naturalmente maravilhado com a dimensão dos recursos a distribuir pelos seus.

Por último, porque a festa não se faz apenas em torno da forma, mas também da substância, a distribuição de pelouros e competências no seio do Governo também não deixa ninguém indiferente.Subitamente temos um vice-primeiro ministro a dominar as pastas económicas. que vão desde os fundos QREN à internacionalização da economia, mas também a reforma do Estado, mexendo assim em competências de ministros que pareciam estar a escapar à sua esfera de influência. Trocam-se tutelas de institutos e direções-gerais como se de cromos se tratassem, brincam-se às casinhas sem sequer se disfarçar.

Neste Verão, parece ter saído a sorte grande ao país. À silly season juntou-se agora um silly government. Ninguém se poderá queixar de falta de animação.

Artigo publicado sexta-feira no Esquerda.net