Se tivermos de apontar o setor do nosso país que mais informação detém ou produz, a Administração Pública surge naturalmente de forma destacada. Do ambiente ao sistema de ensino, da saúde à segurança social, das atividades económicas à administração interna, o setor público é, de facto, uma gigantesca máquina de recolha, tratamento e gestão de informação. E esta pode ser de tipo diverso, desde estatísticas a dados de gestão, informação geográfica a dados pessoais. Um manancial de informação impressionante, de uma riqueza extraordinária, permitindo caracterizar a realidade dos mais diversos sectores.
Mas calma. Este não é um daqueles artigos que visa alertar os cidadãos para a quantidade de informação que as agências governamentais detêm sobre nós, ameaçando a nossa privacidade. Centremo-nos agora no valor que a informação do setor público tem e como pode ser melhor gerida. De todo este tremendo manancial de informação detido pelo Estado, apenas uma muito pequena percentagem é devolvida à sociedade civil, através de websites, arquivos públicos ou outros centros de recursos.
Deste modo, tendo em conta todas as potencialidades trazidas pela era do digital na disponibilização estruturada de informação, porque razão a abertura tem vindo a processar-se de forma tão lenta? Porque não poderemos assumir que toda a informação do setor público deve ser pública e facilmente acessível por defeito? Exceptuando naturalmente os dados pessoais e informação crítica em termos de segurança, não existem razões de fundo para que o Estado continue a ser “fechado por defeito”.
Precisamente tendo presente o racional acima, as teorias da Administração Pública Aberta (Open Government) têm vindo a ganhar um relevo crescente nos últimos anos. Assume-se a transparência do setor público como uma grande mais-valia no combate à corrupção ou à discricionariedade do Estado, mas também como um instrumento de impulso à qualidade dos serviços públicos. Se a Administração é transparente na sua actividade, nos seus processos, nos dados que detém, passa a poder ser muito melhor acompanhada e monitorizada pelos cidadãos, cujo nível de exigência não pára de aumentar. A Administração terá assim incentivos crescentes para melhorar a sua actividade, o seu modo de funcionamento, a sua necessidade de responder de forma eficiente e eficaz às necessidades dos cidadãos.
A transparência por defeito é também uma mais-valia no envolvimento da sociedade civil, garantindo que esta possa melhor influenciar ou mesmo complementar a gestão pública. Por exemplo, possibilitando que as Universidades consigam melhor utilizar o manancial de informação detido pela Administração Pública. Ou permitindo mesmo que outros atores (associações, pequenas empresas ou mesmo cidadãos) possam reutilizar os referidos recursos com fins públicos diversos. Inúmeras boas práticas existem no desenvolvimento de aplicações para smartphones ou tablets baseadas em informação pública. A transparência assume-se assim também como geradora de pegada económica, uma vez que novos modelos de negócio podem emergir com a utilização de dados abertos.
Em suma, as vantagens de se assumir a “transparência por defeito” na Administração Pública são inúmeras e os meios hoje disponibilizados pelas Tecnologias da Informação e da Comunicação permitem facilmente colocar este tipo de orientação em prática. Importa sim mudar rapidamente as mentalidades dos atores públicos, nomeadamente dos responsáveis políticos, para este novo tipo de realidade. Uma cultura de transparência exige uma muito maior responsabilidade dos atores públicos, é certo. Ora aí está uma excelente “desculpa” para ser rapidamente abraçada.
Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
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