A morte de Eusébio deve naturalmente levar-nos a celebrar o que ele foi e o que representou: um jogador impressionante, um gigante, uma lenda viva, um galáctico vindo dos tempos em que ainda existiam heróis nacionais. Não era um santo, nem os santos são para aqui chamados. Era um homem humilde, um jogador da bola que, detalhe dos detalhes, foi o melhor do mundo. Como jogador, como artista que era, teve o dom de trazer muitas alegrias aos adeptos do Benfica e da Seleção. Levava os estádios à loucura, inspirava e enchia de felicidade todos os que por ele torciam. Mas, como já na altura acontecia, um desportista do seu nível rapidamente se tornou num símbolo do país. O seu nome correu o mundo e levou consigo o nome de Portugal. Portugal tem naturalmente de lhe agradecer por levar o nome do nosso país tão longe.
Todos sabemos que Portugal é um país da bola. Somos o país dos três diários desportivos que dissertam sobre bola. O país dos programas televisivos intermináveis sobre a jornada passada, a atual e a seguinte, o penalti que ficou por marcar, o fora de jogo mal tirado e o estado psicológico deste e daquele craque. Somos o país dos ruinosos estádios do Euro 2004 e das perigosas ligações entre a política e a bola. Somos igualmente o país com mais intelectuais da bola e treinadores de bancada por metro quadrado e onde falar de futebol é sempre, mas sempre, um bom tema de conversa de circunstância. Ou seja, existem uma série de razões para “às vezes” nos chatearmos com a febre da bola que temos. Por sermos tão obstinados com o raio da bola.
Só há aqui um pequeno pormenor que não nos devemos esquecer: o futebol é o desporto rei em todo o mundo. Nenhum outro desporto arrasta multidões tão grandes como o futebol. E, vai-se lá saber porquê, este pequeno país de 10 milhões de habitantes é uma potência indiscutível da bola. Este país é agora o n.º 5 do ranking da FIFA. Este é o país do Cristiano Ronaldo e do José Mourinho, do Figo e do Eusébio. É o país com jogadores espalhados pelas melhores equipas do mundo. O país que, para além do selecionador português, leva ao mundial também o selecionador da Grécia (Fernando Santos) e do Irão (Carlos Queirós). Ou seja, somos um país de doentes da bola. E acreditem que muitos e muitos países o são. Mas somos também um país de facto muito bom na bola.
Como é óbvio, preferia ter um país conhecido por uma poderosa indústria científica, por uma imponente indústria da tecnologia ou por uma contagiante indústria cultural. Mas achar que ser uma potência do desporto rei é coisa pouca revela alguma pequenez de espírito. Em última instância, o futebol é hoje um fenómeno que arrasta multidões em todos os continentes. Em todo o mundo se vibra com o futebol. E se Portugal é conhecido pelo futebol, não há razão nenhuma para não tirarmos todo o proveito desta indústria de milhões.
Por exemplo, Cristiano Ronaldo é hoje a marca mais conhecida que Portugal tem em todo o mundo. Se hoje apanharmos um táxi em Amã, em Santiago do Chile ou em Seul, o taxista com certeza saberá quem é Ronaldo. Aliás, a probabilidade de acontecer um “Portugal? Cristiano Ronaldo!” num qualquer café ou restaurante do globo é gigantesca.
Portugal é grande na bola. E ser grande na bola num mundo onde a bola reina, se calhar não é tão mau quanto isso. Continuará a existir Portugal para além da bola e é bom que exista cada vez mais. De qualquer modo, o país deve estar grato aos Figos, aos Ronaldos e aos Mourinhos O nome deles leva o nome do país muito mais longe. E, bem a propósito, obrigado Eusébio por seres o rei que começou esta odisseia.
Artigo publicado a 7/01/2014 no Açoriano Oriental
Sem comentários:
Enviar um comentário