É suposto as reentrés trazerem-nos alguma novidade. No fundo, devem transmitir-nos a sensação de vamos começar algo de novo ou que vamos pelo menos recomeçar de forma revigorada algo que ficou em stand by há pouco tempo atrás. Não se pede uma mudança profunda de paradigma mas, com baterias carregadas após o período do Verão, é normal esperar um pouco de ar fresco para enfrentarmos os desafios que aí vêem. No entanto, por não termos tido direito a uma pausa “silly seasiana” durante este Verão, parece que agora não estamos a reentrar em lado nenhum, uma vez que não tivemos sequer oportunidade de sair do que quer que seja.
E é de facto o caso BES que teima em concentrar as nossas atenções, com todas as suas aventuras e desventuras, supresas e revelações. Neste fim-de-semana ficámos a saber que o homem que era a solução para todos os problemas do banco, o fantástico, o independente e o patriota Vitor Bento afinal já se demitiu. Ou seja, conseguiu o poderoso feito de encarnar a personagem de grande salvador da nação durante apenas dois meses. Acabou por bater com a porta e colocar-se a milhas porque percebeu que o que ali encontrou ia manchar em demasia o seu nome. Encontrou com certeza o que não queria, teria de assumir posições que não devia. Afinal de contas, o sacrifício patriótico a que se submeteu tinha limites, estávamos à espera do quê?
E é assim que caso o BES, com todo o respeito pelos profissionais do volante, faz surgir o taxista que existe em cada um de nós. Estes episódios novelescos fazem-nos perder qualquer réstia de esperança em encontrar um pingo de seriedade em todo o processo. Olhamos em volta e já todos nos parecem gatunos, bandidos e aldrabões. Ninguém parece ser de confiança, ninguém parece merecer sequer a nossa atenção.
A verdade é que este “sentimento taxista” de pouca empatia e grande desconfiança com tudo o que circunda o caso assenta numa série de razões. Em primeiro lugar, porque temos a sensação que o seu desfecho vai sobrar para cada um de nós. Quer através da intervenção direta vinda dos cofres estatais para tapar o buraco encontrado. Quer através da turbolência e contágio nos mais diversos setores da economia nacional, que começou desde logo a fazer-se sentir.
Em segundo lugar, porque somos capazes de apostar que a culpa irá morrer solteira, como sempre acontece nestas grandes trafulhices nacionais. “Too big to fail, too big to jail”, eis a expressão que assenta bem neste caso e seus protagonistas. Muita tinta irá correr, muitos julgamentos e muitos recursos vão com certeza acontecer e... Nada. Os processos decorrerão durante anos até se chegar à fase em que já ninguém se lembra muito bem do que está em causa.
E, em terceiro lugar, somos convidados a este “sentimento taxista” porque no meio das surpresas e indignações que vão surgindo na praça pública vindas dos mais diversos quadrantes, temos a certeza que os indignados de hoje ainda ontem eram bastante próximos do Grupo Espirito Santo e dos seus protagonistas. Muitos dos indignados de hoje dificilmente andavam totalmente a leste das jogadas em curso. Hoje convém-lhes demonstrar bem alto a sua indignação para salvaguardar quaisquer confusões futuras.
Um profissional do volante não tem naturalmente de ser um especialista na análise da atualidade política e económica nacional. É portanto natural que a sua análise se revista de alguma superficialidade que acaba frequentemente no discurso do “são todos iguais, são todos uns gatunos”. Mas a bem dizer, o que se anda a passar no caso BES é mais um convite dourado para que este discurso indignado e pessimista se instale em qualquer cidadão. A alienação política agradece, abrindo então uma passadeira vermelha aos discursos populistas e aos Marinhos Pintos desta vida.
Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
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