Se perguntarmos a um cidadão o que lhe vem à cabeça quando falamos em “Administração Pública”, os resultados não são particularmente animadores. Burocracia, complexidade, falta de eficiência, um amplo aparelho fechado sobre si mesmo e de costas voltadas para a sociedade civil. Os cidadãos não percebem bem como funciona a Administração Pública, como se organiza, como planeia, como opera, como decide, como atua, que gastos possui, que informação detém, entre outras dimensões. Este grande desconhecimento e afastamento perante uma Administração Pública fechada a sete chaves explica a por vezes evidente falta de sintonia entre o aparelho público e a sociedade civil (cidadãos, empresas, academia, ONGs).
Neste sentido, o conceito de Administração Aberta (Open Government) tem vindo a afirmar-se progressivamente nos últimos anos. Materializa-se na defesa de três pilares: 1) Transparência; 2) Participação e 3) Colaboração. Não trazendo em si conceitos absolutamente novos, a verdade é que muitos têm vindo a ganhar um novo impulso quando agrupados em torno deste desígnio de Administração Aberta. Sobretudo porque, nos nossos dias, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) disponibilizam ferramentas ímpares para possibilitar a referida abertura da Administração Pública. As TIC vieram determinar que a referida abertura passe a estar dependente sobretudo de vontade política para o efeito, porque os meios para a suportar são hoje mais do que muitos.
E verdade seja dita, exemplos não faltam hoje a este respeito, nomeadamente em Portugal. Se nos centrarmos no pilar da transparência, o portal Base.gov.pt concede-nos um excelente exemplo. Num único portal, os cidadãos têm acesso a toda a contratação desenvolvida pela Administração Pública Central. Por outro lado, o mais recentemente lançado Portal da Transparência Municipal (www.portalmunicipal.pt) agrega de forma intuitiva, um conjunto diverso de estatísticas que permitem caracterizar cada um dos municípios a nível nacional.
Existem também uma série de bons exemplos se nos centramos no pilar da participação dos cidadãos. Destaca-se a multiplicação de orçamentos participativos em municípios de todo o país. Lisboa foi pioneira a este respeito (www.lisboaparticipa.pt), mas existem autarquias tão diversas como Grândola, Guimarães ou Ponta Delgada que integram já um vasto grupo a nível nacional.
No que ao pilar da colaboração diz respeito, temáticas como os Dados Abertos assumem particular destaque, preconizando-se a disponibilização de informação pública com objectivos reutilização. Qualquer cidadão, empresa ou universidade consegue assim agarrar em conjuntos de dados públicos e produzir, por exemplo, aplicações de utilidade pública para tablets ou smartphones. O portal nacional Dados.gov.pt, lançado há quase 5 anos, é um bom exemplo do esforço nacional nestes domínios.
Na inesquecível série da BBC dos anos 80 “Sim, Sr. Ministro”, quando questionado sobre Administração Aberta (Open Government), Sir Humphrey Appleby (que concentra em si todos os estereótipos do funcionalismo público) reage afirmando que tal encerra um profundo paradoxo: “Whether it is open, whether it is government”. Os exemplos acima demonstram bem que não é hoje um paradoxo defender uma Administração Pública transparente perante os cidadãos, permeável à sua progressiva participação e capaz até de colaborar com estes no desenvolvimento de políticas públicas. Pelo contrário, tornou-se sim um profundo paradoxo continuarmos a ter uma Administração fechada em inúmeros sectores, receosa dos efeitos da abertura.
É tempo de mudarmos estas mentalidades, demonstrando que a abertura da Administração Pública é uma oportunidade ímpar de garantir uma maior proximidade e sintonia perante os cidadãos e, em última análise, um mecanismo único de promoção da qualidade dos serviços públicos.
Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
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