Na semana em que o Governo apresenta um novo programa de rescisões na Administração Pública, percebemos mais uma vez que existem receitas diversas (possivelmente tantas quanto as do bacalhau) para acabar com a Administração Pública). Mas a seguida por este Executivo é digna de estrelas Michelin. E mais do que olhar para a forma criativa como se alinham os diversos ingredientes no discurso político, vale sempre a pena recordar quais são os ingredientes base da receita.
A Administração Pública é Ineficiente. Começamos sempre por este argumento de que a máquina até é boa, até faz umas coisas interessantes, mas é naturalmente ineficiente. Coloca-se lado a lado o funcionamento público e o funcionamento privado e chega-se logo a esta brilhante conclusão. E para quê ter em conta que as obrigações de um serviço público (e.g. transparência, equidade, independência, universalidade) são condicionantes que o distinguem desde logo de um serviço privado? Não vale a pena chatear os cidadãos com estes pormenores. O que importa é colocar público e privado lado a lado e pronto.
A Administração Pública é Gorda. É um facto. Os índices internacionais até podem dizer que Portugal não é diferente da maioria dos países desenvolvidos no que ao peso do setor público diz respeito. Mas importa sempre que esta ideia das gorduras do Estado não desapareça. Pelo contrário, é uma visão sempre útil para justificar todas e quaisquer reformas que se pretendam implementar. Os autores das mesmas nunca querem diminuir ou acabar com as funções sociais do Estado (que ideia?!). Apenas querem livrá-lo das suas ineficiências gordurosas.
A Administração Pública é uma cambada de privilegiados. Como já não bastasse o sacrilégio de ter alguma segurança no trabalho (um horror…), os funcionários públicos trabalham pouco, ganham muito e têm privilégios como ninguém. Toda a gente o sabe, para quê sequer perder tempo a detalhar mais esta questão. Por isso, quando é preciso apertar o cinto, nada como desenvolver numa espécie de luta de classes contra os privilegiados da função pública.
A Administração Pública tem algumas pessoas que se aproveitam. Desengane-se pois quem acha que todos os funcionários públicos são maus. Não são todos assim. Alguns até se aproveitam. Alguns até são bons. Mas importa sim separar a boa moeda da má moeda.
A Administração Pública até deve existir. Sim, o bom liberal até acha que o país precisa de uma Administração Pública. O bom liberal até “concorda” com a Administração Pública. Mas, tem de ser uma boa Administração Pública, e não uma má Administração Pública. Um quadro mental bastante profundo, portanto.
Com algumas variações quanto à disposição dos ingredientes, e com um ou outro ingrediente secreto para alegrar cada uma das novas reformas, as receitas para acabar com a Administração Pública não variam muito. Quando muito encontramos inovação na forma como a receita é apresentada no prato. Porque, de resto, o conteúdo é já bem conhecido de todos.
Artigo publicado na sexta-feira no Esquerda.net
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