terça-feira, 10 de junho de 2014

Os Desafios do Bloco


Para além dos valores alarmantes da abstenção, as últimas eleições foram também marcadas por uma significativa fragmentação das tendências de voto. Destaque natural para o MPT, que devido ao estilo “Beppe Grilo” do seu candidato, atingiu os 7%, conseguindo assim ir buscar votos sobretudo ao centro-direita. Mas foi à esquerda que a fragmentação assumiu proporções maiores. O Livre de Rui Tavares ultrapassou os 2%, com uma estreia invejável nas urnas. O PAN, embora seja mais do que questionável se se trata de uma força de esquerda ou não, também ficou próximo dos 2%. Na esquerda, esta fragmentação não se refletiu na votação obtida pelo PCP. Pelo contrário, a pouca flexibilidade programática dos comunistas foi desta vez recompensada com um resultado histórico, à beira dos 13%. O Bloco, por seu turno, obteve mais uma pesada derrota, sendo notoriamente a força política mais afetada pela fluidez do eleitorado.

Os problemas do Bloco têm sido bastante debatidos nos últimos tempos. Sendo o mais recente partido com representação parlamentar, possui uma estrutura orgânica frágil, com fraca implantação local e uma baixíssima taxa de militância, ficando portanto mais sujeito a flutuações eleitorais. Por outro lado, enquanto partido recente, os seus bons resultados ficaram tipicamente a dever-se ao carisma da liderança e a uma boa capacidade de posicionamento na agenda política, ganhando protagonismo em temas que marcam sempre o eleitorado: desde a oposição de primeira linha às intervenções militares no Iraque e no Afeganistão, passando pela temática dos direitos dos homossexuais, dos imigrantes ou a legalização da canábis. Para além deste domínios, posicionamentos fortes na defesa da educação pública ou do sistema nacional de saúde valeram-lhe grande reconhecimento e simpatia externa.  O Bloco conseguiu assim encontrar um bom espaço entre o centrismo do PS e a ortodoxia do PCP, ganhando um eleitorado de centro-esquerda e da esquerda radical que até então encontrava dificuldade em posicionar-se nos partidos existentes.

Mas do mesmo modo que beneficiou de uma flutuação rápida de determinado eleitorado para as suas hostes, mantê-lo e fazê-lo crescer revelou-se sempre como o grande desafio. Sobretudo quando este eleitorado é conhecido por ser tipicamente jovem, tipicamente qualificado e tipicamente urbano. No fundo, a fatia do eleitorado mais exigente, mais informada, que não perdoa pequenos deslizes. Por outro lado, se antes beneficiava de boa imprensa, que em muito o fez crescer comparativamente com um PCP por exemplo, os referidos tempos áureos terminaram. As suas fragilidades internas e externas passaram a ser melhor exploradas pela comunicação social, o que naturalmente criou mossa. Opções arriscadas nos últimos anos, como a famosa recusa em dialogar com a Troika, o apoio imediato a Manuel Alegre ou passagem para uma direção bicéfala, pagaram-se caro. A saída de alguns militantes emblemáticos também teve grande impacto. 

Mas mais do que explorar opções erradas ou pouco compreendidas, assim como personalizar problemas, o momento atual no Bloco deve ser analisado através da sua capacidade ou não de se reposicionar, de reagir à onda negativa em curso. A sua capacidade de procurar rapidamente adaptar-se à mudança em curso e não perder um espaço político entre o PS e o PCP que, continuando a ter enorme potencial, é também bastante volátil. Que caminhos podem, a meu ver, ser melhor explorados? O Bloco deverá reforçar a sua base militante e estruturas locais, aproximando-se de um modelo de partido de massas, ou continuar a ser um partido que faz sobretudo uma exploração inteligente da agenda em curso? Deverá endurecer a sua linha política ou deverá procurar convergências e denominadores comuns à esquerda? Abordarei estes necessários desafios no próximo artigo.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental

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