Poderá ser considerada por alguns como mais uma de muitas iniciativas que procuram fazer pontes entre sensibilidades diversas da esquerda portuguesa. Se for mais uma, vale por si só. Se for mais do que isso, tanto melhor. Não pestanejei naturalmente em a subscrever. Estes têm de ser tempos de convergência, de união de esforços, de definição de zonas de entendimento entre as forças políticas à esquerda. Tais entendimentos são fundamentais face à ofensiva contra um modelo social que, com todos os seus problemas, continua a ser uma conquista cidadã e uma conquista democrática tremenda. Esta união de vontades representa, entre outras coisas, um primeiríssímo passo neste sentido: diagnosticar e ver possibilidades de ação.
Resgatar Portugal para um futuro decente
“Só vamos sair da crise empobrecendo”. Este é o programa de quem governa Portugal. Sem que a saída da crise se vislumbre, é já evidente o rasto de empobrecimento que as políticas de austeridade, em nome do cumprimento do acordo com a troika e do serviço da dívida, estão a deixar à sua passagem. Franceses e gregos expressaram, através do voto democrático, o seu repúdio por este caminho e a necessidade de outras políticas. Em Portugal, o discurso da desistência e das “inevitabilidades” continua a impor-se contra a busca responsável de alternativas.
Portugal continua amarrado a um memorando de entendimento que não é do seu interesse. Que nos rouba a dignidade, a democracia e a capacidade de coletivamente decidirmos o nosso futuro. O Estado e o trabalho estão reféns dos que, enfraquecendo-os, ampliam o seu domínio sobre a vida de todos nós. Estamos a assistir ao mais poderoso processo de transferência de recursos e de poderes para os grandes interesses económico-financeiros registado nas últimas décadas.
Tudo isto entregue à gestão de uma direita obsessivamente ideológica que substituiu a Constituição da República Portuguesa pelo memorando de entendimento com a troika. E que quer amarrar o País a um pacto orçamental arbitrário, recessivo e impraticável, à margem dos portugueses. Uma direita que visa consolidar o poder de uma oligarquia, desmantelar direitos, atingir os rendimentos do trabalho (que não sabe encarar como mais do que um custo), privatizar serviços e bens públicos, esvaziar a democracia, desfazer o Estado e as suas capacidades para organizar a sociedade em bases coletivas, empobrecer o país e os portugueses não privilegiados.
Num dos países mais desiguais da Europa, o resultado deste processo é uma sociedade ainda mais pobre e injusta. Que subestima os recursos que a fortalecem, a começar pelo trabalho. Que hostiliza a coesão social. Que degrada os principais instrumentos de inclusão em que assentou o desenvolvimento do País nas últimas quatro décadas: Escola Pública, Serviço Nacional de Saúde, direito laboral, segurança social.
Este é um caminho sem saída. O que está à vista é um novo programa de endividamento, com austeridade reforçada. Sendo cada vez mais evidente que as políticas impostas pela troika não fazem parte da solução. São o problema. Repudiá-las sem tibiezas e adotar outras prioridades e outras visões da economia e da sociedade é um imperativo nacional.
Este é o tempo para juntar forças e assumir a responsabilidade de resgatar o País. É urgente convocar a cidadania ativa, as vontades progressistas, as ideias generosas, as propostas alternativas e a mobilização democrática para resistir à iniquidade e lançar bases para um futuro justo e inclusivo que devolva às pessoas e ao País a dignidade que merecem.
São objetivos de qualquer alternativa séria: a defesa da democracia, da soberania popular, da transparência e da integridade, contra a captura da política por interesses alheios aos da comunidade; a prioridade ao combate ao desemprego, à pobreza e à desigualdade; a defesa do Estado Social e da dignidade do trabalho com direitos.
É preciso mobilizar as energias e procurar os denominadores comuns entre todos os que estão disponíveis para prosseguir estes objetivos. Realinhar as alianças na União Europeia, reforçando a frente dos que se opõem à austeridade e pugnam pela solidariedade, pela coesão social, pelo Estado de Bem-Estar e pela efetiva democratização das instituições europeias.
É fundamental fazer escolhas difíceis: denunciar o memorando com a troika e as suas revisões, e abrir uma negociação com todos os credores para a reestruturação da dívida pública. Uma negociação que não pode deixar de ser dura, mas que é imprescindível para evitar o afundamento do país.
Para que esta alternativa ganhe corpo e triunfe politicamente, é urgente trabalhar para uma plataforma de entendimento o mais clara e ampla possível em torno de objetivos, prioridades e formas de intervenção. Para isso, apelamos à realização, a 5 Outubro deste ano, de um congresso de cidadãos e cidadãs que, no respeito pela autonomia dos partidos políticos e de outros movimentos e organizações, reúna todos os que sentem a necessidade e têm a vontade de debater e construir em conjunto uma alternativa à política de desastre nacional consagrada no memorando da troika e de convergir na ação política para o verdadeiro resgate democrático de Portugal. Propomo-nos, em concreto, reunindo os subscritores deste apelo, iniciar de imediato o processo de convocatória de um Congresso Democrático das Alternativas. Em defesa da liberdade, da igualdade, da democracia e do futuro de Portugal e do seu papel na Europa. E apelamos a todos os que não se resignam com a destruição do nosso futuro para que contribuam, com a sua imaginação e mobilização, para a restituição da esperança ao povo português.
Em baixo, estão apenas os primeiros 300 promotores deste congresso. Espera-se naturalmente que sejam apenas os primeiros de muitos.
Abel Joaquim de Almeida Tavares (Militar de Abril), Abílio Hernandez Cardoso (Professor universitário jubilado), Adolfo Gutkin (Encenador teatral),Adriano Campos (Sociólogo e ativista), Alberto Midões (Médico cirurgião), Alexandre Oliveira (Produtor), Alfredo Assunção (Militar de Abril), Alfredo Barroso (Ensaísta e comentador político), Almerinda Teixeira, Alvaro Garrido (Historiador e Professor universitário), Amadeu Garcia dos Santos(Militar de Abril), Ana Benavente (Socióloga), Ana Catarina Mendes (Jurista e Deputada), Ana Costa (Economista e Professora universitária), Ana Drago(Socióloga e Deputada), Ana Maria Pereira (Chefe de serviços), Ana Pires (Geógrafa), Ana Sousa Dias (Jornalista), André Barata (Professor universitário), André Freire (Politólogo e Professor universitário), Aniceto Afonso (Militar de Abril e Historiador), Antero Ribeiro da Silva (Militar de Abril),António Antunes Ribeiro (Engenheiro), António Arnaut (Advogado), António Avelãs (Professor e sindicalista), 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