sábado, 30 de junho de 2007

Faltam Publicações à Esquerda…

O panorama das publicações periódicas de ideias políticas, ou assumidamente de uma corrente política, tem evoluído significativamente nos últimos anos em Portugal. As novas publicações de direita parecem, no entanto, não encontrar paralelo à esquerda.

As publicações à direita parecem conseguir um maior êxito. Destaca-se a revista Nova Cidadania, de tendência neoconservadora, que tem conquistado bem o seu espaço. Destaca-se também a revista Atlântico, de tendência liberal. Um projecto mais recente que, com uma periodicidade mensal, tem mantido uma qualidade significativa número após número.

Ambas as revistas parecem não ter equivalente no panorama da esquerda. A edição portuguesa do Le Monde Diplomatique é uma referência, mas não atinge o mesmo sector de mercado. Por seu turno, as revistas Manifesto, Vértice e Ideias à Esquerda, embora de âmbito diferente, parecem já estar fora de publicação.

As correntes de esquerda não conseguem levar a cabo projectos semelhantes aos bem sucedidos casos da Atlântico e da Nova Cidadania? Não haverá nenhum grupo de comunicação interessado em cobrir esta lacuna no mercado das publicações periódicas?

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Os comentários "jocosos" fazem mais uma vítima

Nota prévia:
Jocoso:
Adjectivo: que provoca riso, particularmente através da troça; divertido;
engraçado; trocista; chistoso.
Do lat. jocósu-, «id.»
(in Dicionário de Língua Portuguesa, Porto Editora)

Comentários "jocosos" feitos por um médico do Centro de Saúde de Vieira do Minho a declarações do ministro da Saúde publicadas num jornal, motivam a exoneração da directora do centro de saúde.

Maria Celeste Cardoso foi afastada do cargo por não ter retirado das instalações do centro de saúde que dirigia, um cartaz que continha uma notícia com uma declaração de Correia de Campos em que o Ministro dizia nunca ter entrado num Serviço de Atendimento Permanente, à qual era feito o seguinte comentário: "Façam como o ministro, não venham ao SAP".
Correia de Campos justificou a exoneração acusando-a de "deslealdade" e "incapacidade" para o cargo, podendo ler-se no despacho de exoneração que esta se deve ao facto de a directora “não ter tomado medidas relativas à afixação, nas instalações daquele Centro de Saúde, de um cartaz que utilizava declarações do Ministro da Saúde em termos jocosos, procurando atingi-lo".

Assim que me lembre, é já a terceira vez que, num curto espaço de tempo, se pune (ou procura punir) quem faz ou não se opõe directamente a comentários relativos a membros do Governo. É caso para dizer, cuidado! …podes ser a proxima vítima.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Sobre o Referendo ao Novo Tratado Europeu

No debate de ontem no parlamento, Sócrates confirmou aquilo que muitos comentadores já suspeitavam. Contrariando o prometido em campanha eleitoral, o Governo considera agora mais prudente que o novo tratado não seja sujeito a referendo.

Com o argumento de que o novo tratado europeu será “mais um tratado internacional, sem natureza constitucional”, tenta-se assim contrariar o facto de que esta nova versão inclui 80% a 90% do previsto na anterior versão.

Admito a existência de algumas questões que poderiam justificar a “não-necessidade” de um referendo. As mesmas possuem, no entanto, um forte carácter de real politik. Ou seja, poder-se-á argumentar que o referendo é desnecessário tendo por base o receio do eventual chumbo pelo eleitorado. Neste contexto, será sempre muito mais confortável que a sua aprovação seja da exclusiva competência do parlamento. No fundo, uma posição de realismo político puro e duro.

Em oposição, poderá considerar-se que os diversos domínios previstos pelo novo projecto de tratado deverão ser objecto de uma aprovação dos cidadãos através de referendo. Esta segunda posição assume-se mais progressista, depositando nos cidadãos a responsabilidade final da aprovação de um importante projecto político.

Naturalmente, embora possa compreender ligeiramente os opositores do referendo, não tenho dúvidas que a democracia ganhará muito mais com a segunda solução. Embora possa revelar-se uma prova difícil, a submissão a referendo de um projecto como o do novo tratado é fundamental para o próprio envolvimento dos cidadãos no edifício comunitário.

Muitos podem invocar os riscos da solução referendo. A estes respondo que a democracia é feita de riscos. É aliás a sua capacidade de resistência a riscos diversos que a torna num regime político tão especial. Confiemos na democracia e nos seus caminhos.

terça-feira, 26 de junho de 2007

Berardo pede Demissão de Mega Ferreira

Perante a tremenda afronta de não estarem hasteadas as bandeiras, Joe Berardo não hesita: demita-se o director do Centro Cultural de Belém!

Aí está… Passada a pomposa inauguração do seu Museu no Centro Cultural de Belém, Joe Berardo mostrou-se hoje insatisfeito. Justificou-se dizendo que as pessoas sabiam que, se ele tinha algo para dizer, dizia. E qual o motivo da insatisfação de Berardo? As bandeiras na parte frontal do CCB não estavam hasteadas, à semelhança do que acontece com outros grandes eventos no Centro. Como tal, Berardo sugeriu a Mega Ferreira que se demita. Sem mais… Pede a demissão do Director do CCB porque as bandeiras não estavam hasteadas.

Berardo parece assim não ter ficado contente com o jantar de 800 convidados. Parece também ter considerado normal a presença inclusive do Primeiro-Ministro na inauguração. Para o magnata madeirense, o céu parece ser o limite. Neste contexto, perante tal afronta do director do CCB, pede a sua demissão.

Se calhar podemos ver aqui os primeiros sinais do perigo das mordomias do poder político perante o poder económico… Este último acha-se então imediatamente no direito de agir muito para além do seu campo de actuação.

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Claustrofobia Berardiana

Joe Berardo parece estar em todo o lado. Nos últimos meses, não há semana em que o magnata madeirense não tenha direito a pelo menos uma manchete. Avé Berardo, o omnipresente capitalista lusitano.

Os jornais noticiam hoje a magistral abertura do mais recente museu de arte contemporânea em Portugal: o Museu Berardo. A cerimónia contará com a presença de mais de 800 convidados, incluindo o Primeiro-Ministro e a Ministra da Cultura. Como lhe chamou o Bicho Carpinteiro, também acho que estamos perante a grande “figura iconográfica do capitalismo lusitano” da actualidade.

Nos últimos tempos, Joe Berardo parece estar em todo o lado. Tendo em conta apenas os últimos dois meses, começou por aparecer na questão da OPA sobre a PT. Mais recentemente, financiou o estudo sobre a alternativa Alcochete para o novo aeroporto de Lisboa. Há duas semanas, lançou a OPA sobre o Benfica. Na semana passada, esteve na grande entrevista com Judite Sousa e teve ainda tempo para mostrar-se disponível para financiar o estudo da solução Portela +1. Hoje, a inauguração do seu museu (uma história que já vem de trás, é certo) faz manchete nos principais órgãos de comunicação social.

Adaptando a expressão de Paulo Rangel, começo a acusar fortes sintomas de Claustrofobia Berardiana

Empresários da Invicta Solidários com Lisboa

A Associação Comercial do Porto vai mesmo avançar com o estudo Portela +1. O estrondoso investimento em torno do novo aeroporto de Lisboa presta-se a estas estranhas solidariedades.

Depois da polémica da expulsão da Associação Comercial do Porto da comissão que financiou o estudo de Alcochete, a primeira pretende agora avançar com o estudo sobre a viabilidade da solução Portela +1. Os alfacinhas agradecem esta tão importante manifestação de solidariedade vinda da Invicta.

A solidariedade demonstra, naturalmente, toda a dimensão dos interesses económicos em torno de tão importante investimento público. Os empresários do Norte também querem ter algo a dizer e, claro, a ganhar com a construção do novo aeroporto. Umas empreitadazinhas aqui, umas comissõezinhas de serviços acolá… Daqui a uns dias teremos estudos financiados pelas associações comerciais de diversas zonas do país: Coimbra, Aveiro, Faro e, porque não, Funchal e Ponta Delgada.

Será interessante verificar, daqui a uns anos, qual a ligação de todos os actuais beneméritos com a obra então realizada.

domingo, 24 de junho de 2007

Ensino Superior: Só os Estudantes Protestam?

Começaram já os protestos contra o Regime Jurídico do Ensino Superior. Parece, no entanto, que os estudantes são os únicos que se interessam ou se preocupam verdadeiramente. Será normal?

Durante a última semana, algumas dezenas de estudantes da Universidade de Coimbra vieram a pé para Lisboa. Motivo: protestar contra o Regime Jurídico do Ensino Superior. O novo regime prevê, entre outras coisas, a transformação de universidades em fundações, algumas restrições à autonomia universitária, um mais apertado controlo financeiro. Destaca-se, por outro lado, a nomeação dos reitores, que deixam deste modo de ser eleitos por estudantes, professores e funcionários.

Dada a diversidade de alterações previstas, que serão discutidas e aprovadas a 28 de Junho, não será de estranhar que apenas os estudantes assumam o protesto? Onde estão os funcionários das instituições? E a eloquente comunidade docente, não estão preocupada com o novo regime?

É normal que os estudantes assumam, mais uma vez, a “testa de ferro” neste tipo de protesto. O seu envolvimento com a política académica acaba por ser sempre muito mais activo do que o da comunidade docente. Intriga-me, no entanto, nunca ter visto nos últimos anos, com todas as transformações ocorridas, uma única mobilização nacional de docentes do Ensino Superior… Limitam-se a conversas de preocupação nos corredores…

quinta-feira, 21 de junho de 2007

Telmo Correia: um Eterno Promissor?

O agora candidato a Lisboa do CDS possui qualidades políticas inegáveis. No entanto, até hoje, não tem conseguido ultrapassar o rótulo de “eterno promissor”.

Infelizmente não tive oportunidade de acompanhar o debate dos candidatos à Câmara de Lisboa na terça-feira. Entre os galhardetes que a imprensa destacou no dia seguinte, sublinho a reacção de Telmo correia à proposta de um “Simplis” feita pelo candidato socialista: “O Dr. António Costa já saiu do Governo, mas parece que o Governo ainda não saiu dele”. Brutal. Um digno exemplar de boa retórica política, na qual Telmo Correia encarna na perfeição as virtudes do líder do seu partido.

Estou muito longe de partilhar das ideias políticas de Telmo Correia. Reconheço, no entanto, que possui preciosas características que o poderiam impulsionar ainda mais na vida política. Destaco a sua capacidade de discurso e retórica política, mas poderia também sublinhar o forte currículo que tem no seu partido, na Assembleia da República, possuindo inclusive currículo governamental (Secretário de Estado do Turismo no Governo de Santana Lopes).

No entanto, alguns percalços no seu percurso têm-se revelado fatais. Perdeu para Ribeiro e Castro, de forma imperdoável, a hipótese de suceder a Paulo Portas. Agora, com o regresso do "grande líder", é atirado para Lisboa, sendo que a última sondagem lhe atribui cerca de 2,5% das intenções de voto. Embora seja natural que consiga arrecadar um resultado um pouco melhor, a fragmentação de candidaturas em Lisboa ser-lhe-á certamente desfavorável.

Telmo Correia poderá ainda ter muitos anos de política pela frente. No entanto, e como sabemos, a galeria dos eternos promissores da política portuguesa encontra-se a abarrotar. Veremos o que o futuro lhe reserva…

domingo, 17 de junho de 2007

Como Transformar Manifestantes em Apoiantes?

Em Abrantes, os manifestantes renderam-se à presença do primeiro-ministro. Os assobios transformaram-se rapidamente em pedidos de aperto de mão e beijinhos.

Vários telejornais ontem noticiaram o facto de Sócrates ter tido uma recepção pouco amistosa em Abrantes. Algumas centenas aguardavam a passagem do primeiro-ministro em protesto contra o fecho de alguns serviços do hospital local. E assim foi: quando a comitiva passou, Sócrates foi assobiado e vaiado pelos firmes manifestantes.

No entanto, num gesto considerado inesperado, o primeiro-ministro decidiu enfrentar a multidão que ali se reuniu, explicando que as mudanças previstas em nada os prejudicariam. Foi interessante verificar que, antes mesmo de Sócrates explicar o que quer que seja, os mesmos manifestantes que momentos antes o tinham vaiado, desdobraram-se então em beijinhos e apertos de mãos. Renderam-se assim alegremente à presença do primeiro-ministro. Capitularam perante a “celebridade” que todos os dias vêem nos telejornais. Mais um pouco, e teríamos assistido a pedidos de autógrafos.

O acto de enfrentar a multidão revelou-se uma jogada extremamente inteligente de Sócrates. Independentemente das explicações que proferiu, a sua presença acalmou logo os manifestantes, que vertiginosamente se transformaram em apoiantes. Eis uma inteligente receita política para se passar rapidamente “de besta a bestial”.

Uma Semana Complicada

Desde o tremendo passo atrás no caso OTA, até à inconstitucionalidade declarada na repetição dos exames do 12º ano, passando pelas recepções “pouco amistosas” no 10 de Junho e agora em Tomar. Anseia-se pelo início da Presidência Portuguesa da UE.

É normal que, com o decorrer dos mandatos, os governos comecem a acusar algum desgaste. O desgaste ocorre normalmente por vagas, com semanas ou meses melhores, outras semanas ou meses piores, consoante a benevolência ou não da comunicação social e dos opinion makers.

Aos períodos maus, associa-se também um efeito bola de neve, i.e., os casos sucedem-se, a desorientação e a atrapalhação avolumam-se. Quando as coisas parecem estar mal, conseguem ficar ainda piores.

Esta foi uma semana, no mínimo, complicada para o Governo. Quase todos os dias as as manchetes encheram-se com casos. Naturalmente, as referidas semanas ou meses negros não se reflectem imediatamente nos níveis de popularidade governamentais. Ainda bem que assim o é (de outro modo, os Governos cairiam em meses).

Neste contexto, apesar de constituir um risco, aguardam-se ansiosamente pelas supostas tréguas durante os seis meses da Presidência Portuguesa. Ou as tréguas verificam-se mesmo, ou tudo parece levar a crer que o actual cenário tenderá a complicar-se.

sábado, 16 de junho de 2007

Os Tribunais começam a chegar à Blogoesfera

A Justiça parece querer agora entrar neste ainda novo mundo que é a blogoesfera. A liberdade de expressão estará ameaçada, ou estaremos a assistir a um processo inevitável?

O Expresso noticia hoje que o autor do blog Do Portugal Profundo foi constituído arguido num processo relativo ao percurso académico de José Sócrates. António Balbino Caldeira, professor no Instituto Politécnico de Santarém, foi indiciado como o primeiro a levantar suspeitas quanto à licenciatura do Primeiro-Ministro.

Se calhar pela primeira vez, com maior mediatismo, a Justiça tenta chegar à blogosesfera em Portugal. Quais as consequências de tal facto? Será um atentado à liberdade de expressão? Estar-se-á a limitar uma nova riqueza da democracia?

Concordo com Miguel Martins, editor de multimédia do Expresso, quando afirma que a nossa justiça ainda age de forma muito atabalhoada ao tentar actuar sobre este novo mundo de liberdade de expressão. Concordo também com o perigo de se agir em domínios onde existe ainda uma parca legislação.

Considero, no entanto, que à medida que a blogoesfera se populariza e massifica, e a justiça a ela se tenta adaptar, é inevitável que quem nela escreva possa vir a ser chamado às responsabilidades. No entanto, é nestes períodos de transição que as maiores asneiras podem ser cometidas. Convém, portanto, acompanhar de muito perto o evoluir do processo agora em curso.

Comunicação e Gastos nas Políticas Públicas

O Governo tem apostado fortemente na comunicação de políticas públicas estratégicas, nomeadamente no âmbito da educação e formação. São iniciativas de comunicação que custam milhões ao erário público. No entanto, são despesas que se justificam plenamente.

Normalmente, e de forma leviana, os gastos em comunicação de políticas públicas são facilmente apelidados propaganda ou marketing político. São, no entanto, gastos plenamente justificáveis quando aplicados em políticas estratégicas.

Se a educação e formação são problemas estruturais do país, é necessário um forte esforço para encontrar respostas aos problemas. Mas não chega aumentar os gastos em infra-estruturas, em pessoal, em reformulação de currículos ou na montagem de novas modalidades de formação. É preciso actuar nas sensibilidades e nas percepções. É necessário convencer as pessoas. Neste sentido, o recurso a fortes campanhas nos principais média revela-se fundamental. Custam milhões, é certo. Mas sem estes recursos de comunicação, as melhores estratégias estão votadas a resultados limitados.

Assim sendo, quer concorde ou não com a forma exacta como são comunicadas, aplaudo as fortes campanhas agora em curso sob o signo “Novas Oportunidades” ou direccionadas para a promoção da formação profissional junto dos estudantes do 2º e 3º ciclo. Actuar nas sensibilidades custa dinheiro. Mas são custos plenamente justificados quando se trata de combater um problema estrutural do país.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

O Alívio de António Costa

A decisão do Governo de adiar o concurso do novo aeroporto correspondeu a um tremendo passo atrás. António Costa, por seu turno, suspira de alívio.

O Governo deu um tremendo passo atrás com o adiamento do concurso para o novo aeroporto de Lisboa. No entanto, tendo em conta o incómodo que esta temática causava na candidatura de António Costa a Lisboa, este tem todas as razões para suspirar de alívio.

Como escrevi há alguns posts atrás, a OTA afirmava-se como a mais séria pedra no sapato de António Costa. O ex-ministro já não conseguia encontrar mais explicações para convencer os eleitores da capital de que a melhor solução passaria por lhes retirar o aeroporto da cidade.

Rui Ramos defende, na sua crónica de hoje no Público, que o Governo trocou um aeroporto pela vitória na capital. Não acho que seja caso para tanto. Mas não tenho dúvidas que, sem a incómoda questão da OTA, os adversários de António Costa terão de se esforçar muito mais para lhe retirar o favoritismo nas eleições alfacinhas.
O ex-ministro tem razões para comemorar, não devendo esquecer-se de agradecer aos seus amigos Sócrates e Mário Lino a sua mais recente trapalhada.

IVG, Médicos e a Objecção de Consciência

As recentes notícias parecem ditar grandes dificuldades na aplicação da lei da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). A classe médica pode estar no seu direito. Resta saber como serão salvaguardados os direitos dos cidadãos.

O Público de hoje noticia que no Hospital de Angra do Heroísmo, todos os obstetras invocam objecção de consciência perante a IVGs. Ainda segundo o jornal, em Ponta Delgada o cenário poderá não ser muito diferente. Mas o cenário açoriano não assume, a este respeito, grandes diferenças com o panorama nacional. Por exemplo, no hospital de Santa Maria, o maior do país, cerca de 80% dos médicos já invocaram também objecção de consciência.

Acho que os médicos poderão estar no seu direito. No entanto, tendo em conta que o seu direito põe em causa os direitos de todos os cidadãos, pergunto-me como poderá ser ultrapassado este gravíssimo problema. Entrega-se assim esta área de actividade às clínicas privadas, instituições tão criticadas pelos defensores do “não” no referendo?

Por outro lado, parece que estamos claramente a assistir a uma epidemia de objecções de consciência na classe médica. De repente, uma classe que até nem se manifestou muito na campanha do referendo aparece agora a colocar seriamente em causa a aplicação de uma lei. Esta atitude já é inclusive apelidada por muitos como boicote.

Espero que as objecções invocadas sejam verdadeiramente sinceras, tendo em conta os todos prejuízos que poderão causar aos cidadãos.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

Afinal sempre há alternativas à OTA

Depois da polémica das últimas semanas, o Governo dá agora um tremendo passo atrás quanto à localização do novo aeroporto. Reconhece assim que o seu “impulso implementador”, contra tudo e contra todos, carecia de legitimidade.

Mário Lino anunciou hoje que adiará por seis meses a abertura do concurso para a construção do novo aeroporto. A alternativa Alcochete parece ter ganho peso sobretudo após as declarações de Cavaco Silva na sequência do estudo da CIP. Curioso é verificar o mesmo Mário Lino de há umas semanas atrás vir agora reconhecer a necessidade de se efectuarem mais estudos.

Como é natural, não sou apologista de excessivos estudos para a implementação de políticas públicas. Estes acabam por muitas vezes levar ao “estuda-se muito, faz-se pouco”. No entanto, tendo em conta o peso que a temática do novo aeroporto de Lisboa tem vindo a ganhar, era inevitável a necessidade de estudos que analisem diversas alternativas. Apesar de tudo, a localização do novo aeroporto nunca deixará de ser política, não tenhamos dúvidas a este respeito.

É de lamentar, no entanto, a forma totalmente atrapalhada como o Governo tem lidado com a presente temática. Os resultados estão à vista: um tremendo passo atrás, numa atitude de clara incoerência com o que até ontem defendia.

sábado, 9 de junho de 2007

A Judicialização da Luta Política

A polémica parece estar a estalar. Desta vez, Costa Neves é o protagonista, mas são já previstas (embora sujeitas ainda a confirmação) as participações de Telmo Correio e Nobre Guedes. A judicialização da luta política parece estar a assumir um relevo crescente.

Carlos Costa Neves aparece agora como principal protagonista do caso desta semana. Mas parece não estar só. Pelos vistos, Telmo Correia e Nobre Guedes poderão estar também envolvidos no processo. O caso Portucale, que voltou a estalar esta semana, começa já a prometer fazer correr muita tinta, muitas reportagens, muitas declarações de líderes políticos e, como não podia deixar de ser, muitos posts na blogoesfera.

Como referi já num post anterior, temo que estejamos a assistir a uma judicialização da luta política. A sucessão de casos de constituição de destacados políticos como arguidos apresenta-se como indicador disso mesmo. Recordo que, durante esta semana, também João Soares confirmou ser arguido num processo relacionado com a famigerada Bragaparques.

É preocupante que a justiça possa estar a servir de arma de arremesso entre as forças políticas. A democracia ganha pouco com as referidas práticas. Por outro lado, a judicialização da luta política só é possível quando as ilegalidades e corrupção proliferam numa classe política. Será este o caso português? Temo sinceramente que sim...

sexta-feira, 8 de junho de 2007

E as Ideias para Lisboa?

A cerca de um mês das eleições intercalares para Lisboa, já lemos e vimos muita coisa. No entanto, à semelhança de outros actos eleitorais, destaca-se o show off e as poucas ideias para a cidade. Infelizmente, são sintomas do estádio de desenvolvimento do nosso sistema político democrático.

Há precisamente uma semana, Pedro Magalhães publicou no seu “Margens de Erro” uma importante síntese das sondagens até então feitas para a campanha de Lisboa. Como podemos verificar abaixo, embora todas confirmem o favoritismo de António Costa, as incertezas quanto aos lugares de Carmona, Negrão e Roseta no ranking ainda são muitas

À semelhança de outros actos eleitorais, as sondagens reflectem a progressiva personalização do voto. Os eleitores votam em quem mais lhes apraz, por variadíssimas razões, relegando para segundo plano as ideias concretas que defendidas pelos candidatos.

Como é natural, a selecção dos candidatos reflecte esta mesma prática. Vejamos o processo de candidaturas a Lisboa. A principal preocupação das forças políticas foi a escolha dos candidatos. As ideias para a cidade aparecerão sempre em segundo plano. É uma questão de prioridades. Primeiro escolhe-se a cara. As ideias hão-de ir aparecendo…

A referida situação reflecte também o progressivo decréscimo de importância assumida pelos programas eleitorais. Quem os lê de facto? Possivelmente poucos mais do que os seus próprios autores. Normalmente são documentos extensos, repletos de palavreado e pouco objectivos em termos de políticas a adoptar e projectos a desenvolver.

A campanha de Lisboa reflecte isso mesmo também. Pela curta pesquisa que pude efectuar nos portais dos candidatos, encontrei de tudo: noticias, comissões de honra, galerias de fotos, modelos de angariação de fundos, etc. Quanto a programas eleitorais, a maioria dos candidatos ou não o possui, ou escusa-se a revelá-los no seu portal. É lamentável que assim seja...

quarta-feira, 6 de junho de 2007

O 6 de Junho e o Independentismo Açoriano

Passados 32 anos da maior manifestação independentista açoriana, a temática parece ter desaparecido completamente da memória do arquipélago. O modelo de autonomia política adoptado votou a temática ao quase esquecimento. É paradoxal que assim o seja.

É interessante verificar que, nos nossos dias, quando se fala em independentismo insular, os portugueses imediatamente pensam nas bombásticas e regulares declarações de Alberto João. Quando se aborda a temática dos movimentos independentistas insulares, a pouca população portuguesa que sabe alguma coisa a este respeito consegue referir a FLAMA. Sobre o independentismo açoriano, que surgiu no arquipélago com maior vigor do que o independentismo madeirense, os portugueses sabem muito pouco.

Se calhar convém que assim seja. Convém que a manifestação do 6 de Junho em Ponta Delgada seja recordada como mera curiosidade histórica. Representou, no entanto, bastante mais do que isso. O independentismo nos Açores foi um factor determinante, embora extremo, de afirmação da identidade regional. A forma como se construiu o modelo de autonomia açoriana, durante a conturbada transição para a democracia, foi também influenciada pela ameaça independentista que se fazia sentir em algumas franjas do arquipélago.

Por estas e outras razões, o independentismo açoriano deveria ser melhor recordado. Não numa perspectiva romântica e apaixonada, mas como fenómeno político e social que desempenhou, bem ou mal, um papel determinante na construção do sistema político açoriano.

Bem sei que os diversos partidos açorianos têm dificuldades em abordar a presente questão. Alguns foram actores, outras foram vítimas do independentismo. No entanto, passados 32 anos, se calhar já é tempo de encarar estas questões sem tabus. A História nunca deve ser esquecida. Há sempre muito a aprender com ela…

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Os Métodos da Extrema-Direita

Cerca de um mês depois das rusgas em casas de diversos membros do grupo de extrema-direita Hammerskin, com ligações ao Partido Nacional Renovador, a Policia Judiciária parece ter encontrado indícios de planeamento de atentados contra membros do PS, PCP e BE.

Segundo o Correio da Manhã de Sábado: “Documentos apreendidos nas buscas dão conta da realização de uma reunião na Margem Sul para definir os alvos dos ataques, que previam também a vandalização de sedes partidárias com bombas de fabrico artesanal e cocktail molotov.” (Ver Noticia)

No último post que escrevi sobre o PNR, considerava que o partido se afirma ainda muito incipiente, ainda "pouco experimentado" nas práticas democráticas. A confirmar-se a notícia do Correio da Manhã, constatar-se-á que o âmbito das suas actividades, ou dos seus membros, se encontra no extremo oposto das práticas democráticas.

Podemos sempre questionarmo-nos se as práticas de membros de uma força política deverão ser imputados à mesma. Vejamos, por exemplo, o envolvimento de José Lello, deputado PS, no caso da "Operação Furacão", que implica empresários portugueses detidos no Brasil por pertencerem a uma rede de jogos ilegais.

No entanto, no presente caso do PNR, devido à sua dúbia relação com a democracia, a confirmarem-se as suspeitas sobre os seus membros, as conclusões a tirar não poderão ser lisonjeiras. Sublinho que o que estava em causa era o recurso premeditado a violência contra outras forças políticas. Para além de constituir um grave crime civil, representa sobretudo um evidente esmagamento das normas mínimas de comportamento democrático.

domingo, 3 de junho de 2007

Marques Mendes e o Caso Atlântica

Parece que Marques Mendes tem também algumas pontas soltas no seu passado em Oeiras. A judicialização da luta política pode ter efeitos nefastos. Mas o currículo pouco claro dos líderes políticos portugueses é também preocupante.

Isaltino Morais questionou a Universidade Atlântica sobre o pagamento do então presidente da Direcção, Marques Mendes, com senhas de presença durante quase três anos. Pelos vistos, a própria nomeação de Marques Mendes para a Direcção da Atlântica, em 1999, possui uma irregularidade latente. Então presidente da Assembleia Municipal de Oeiras, Marques Mendes não poderia beneficiar de uma nomeação para uma empresa cujo município era o principal proprietário. (Ver noticia)

Procurando uma pequena desforra de Marques Mendes, Isaltino acabou por colocar em causa as suas próprias decisões. No entanto, o presente caso apenas demonstra o perigo da judicialização da luta política. No seguimento de casos recentes como a Independente, ou o Braga Parques em Lisboa, o líder do principal partido da oposição vê-se agora envolvido numa acusação de irregularidades cometidas no passado.

Naturalmente, os últimos casos judiciais envolvendo a classe política levam-nos mais uma vez a reflectir sobre a idoneidade desta. Não é um assunto novo, antes pelo contrário. No entanto, a crescente judicialização da luta política é preocupante. Qualquer opositor procurará incomodar um qualquer adversário revirando, para tal, o seu passado em busca de irregularidades.
A democracia não ganha com tais métodos. Mas não deixa também de ser preocupante que tantos responsáveis políticos tenham passados que não possam ser “revirados”…

sábado, 2 de junho de 2007

Fátima Felgueiras: a Saga Continua

Com uma regularidade surpreendente, continuamos a obter aos poucos ligeiras, ligeiríssimas, novidades do caso Fátima Felgueiras. O confuso julgamento continua, entre pormenores e acusações graves.

Na última semana, nomes como Sócrates e Jorge Coelho vieram à tona. Pelos vistos, os dois receberam cartas do acusador de Fátima Felgueiras, Horácio Costa, denunciando algumas das irregularidades que se iam passando no concelho.

Apesar de ir aparecendo e desaparecendo da agenda mediática de forma misteriosa, tenho dúvidas sobre qual poderá ser a evolução do caso Felgueiras. Por um lado, a provar-se alguma irregularidade, dificilmente não seriam afectadas algumas caras de destaque do PS Nacional. Quem não se lembra da proximidade de Jorge Coelho com a autarca?

Por outro lado, admiro-me como é que a arguida ainda não foi ilibada de todas as acusações feitas. No fundo, à semelhança do que tem acontecido com Valentim Loureiro ou Isaltino Morais. Integraria assim a galeria de honra dos eternos acusados e eternos ilibados autarcas portugueses.

Pacheco Pereira: A Imprevisibilidade do Intelectual

Não posso dizer que concordo com a vasta maioria das posições de Pacheco Pereira. Antes pelo contrário. No entanto, não posso deixar de admirar a sua postura intelectual irreverente, pouco previsível e independente q.b.

Possui a extraordinária capacidade de deixar quem dele discorda com os dentes a ranger. E consegue fazê-lo precisamente pela verticalidade de algumas das suas ideias e, sobretudo, pela forma como as expõe, pelos argumentos que exibe. Destaco sobretudo a imprevisibilidade do seu argumentário.

Hoje, no seu artigo de opinião no Público, Pacheco Pereira disserta sobre a greve geral. Apesar da sua costela social-democrata indiciar, à partida, uma posição dúbia sobre a greve, consegue mesmo assim surpreender na defesa do fenómeno como direito democrático. Elogiando quem abdica de um dia de trabalho em prol de uma causa. Atacando os que criticam a greve, apelidando-os de “desdenhosos”.

Consegue fazê-lo sem que seja simples chamar-lhe oportunista ou demagogo. Eis a mais-valia de um bom intelectual.

sexta-feira, 1 de junho de 2007

Da Greve Geral à Guerra de Números

Como é natural neste tipo de fenómenos, a CGTP clama vitória com base numa suposta adesão média de 80%. O Governo, por seu turno, afirma que se viveu um dia normal, apontando adesões na ordem dos 12%. Perante este cenário, a pergunta do costume: em que ficamos?

Claro que nunca saberemos os números certos deste tipo de greves de âmbito nacional. Veremos sempre os sindicatos e os governos a digladiarem-se com números absolutamente divergentes. No entanto, relativamente à greve de quarta-feira, fiquei de facto com a sensação que a adesão não foi a esperada. Tal não poderá significar, no entanto, um sinal de apoio às políticas governamentais.

Quantos não aderiram à greve por não poder despender de um dia de salário? Quantos não aderiram por o seu sindicato ser filiado na UGT, que se demarcou da convocatória? Quantos não se sentem à vontade para manifestar no seu local de trabalho o apoio a este tipo de movimentos? Quantos não acreditam na greve como instrumento de reivindicação profissional?

Se quisermos dados fidedignos a este respeito de apoio ou não às políticas governamentais, recorremos naturalmente a sondagens de valor científico para o efeito. Não confundamos a não utilização de instrumentos reivindicativos de ruptura, como a greve, com o apoio às políticas governamentais.

Podemos sim assumir que o desacordo com as políticas governamentais ainda não justificou níveis elevados de ruptura.