terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Tó Zé, seguras-te?


Com o aproximar das Europeias, tem sido interessante acompanhar o cerco que no PS vai sendo feito a António José Seguro. Uma vez que se assume como certa a vitória dos socialistas nas próximas eleições, todos os que nunca estiveram convencidos com a sua liderança elevam naturalmente o patamar do objetivo a atingir em Junho. Já não basta ao PS de Seguro vencer as próximas eleições, será necessário vencer por muitos. O que, trocado por miúdos, equivale a algo como “ou consegues uma vitória brutal, ou então teremos todas as razões para te fazer a cama”. E sejamos claros: não há nada de verdadeiramente surpreendente nesta atitude. As dinâmicas de competição e poder internas nos grandes partidos ao centro, sobretudo quando estão na oposição, determinam que as suas lideranças estejam sempre a ser postas em causa. É normal que assim seja. Torna-se sim curioso observar todos os argumentos que vão sendo levantados pelos adversários internos para colocar em causa a referida liderança.

A liderança de António José Seguro nunca convenceu uma série de setores do partido. Mas as raízes desta dinâmica são sobretudo estruturais. Ou seja, uma liderança que assume um grande partido do centro no momento em que este atravessa o calvário da oposição, será sermpre fortemente criticada. E numa fase em que não há perspetivas de conseguir o regresso ao poder, tais críticas vão sendo pouco concretas. Não existe portanto um adversário ou corrente interna que se assuma como alternativa, existindo sim uma crítica que tem como principal objetivo marcar terreno para o futuro. 

Em linha com o acima exposto, Seguro sentiu esta semana as críticas mais diversas vindas dos seus adversários internos. Em entrevista à Rádio Renascença, Carlos César afirmou que a questão da liderança deve ser reaberta no caso de não existir um bom resultado nas europeias. César nunca se inibiu de criticar esta liderança. Estranho é o ângulo em que esta crítica tem sido feita mais recentemente, sendo agora colocado em causa o rumo “demasiado oponente e pouco proponente da atual liderança socialista”. Não é de facto a primeira vez que César critica Seguro pela direita. Em dezembro último, César também defendeu um governo de coligação PSD e CDS, não deixando de ser curiosa esta sede de uma maior aproximação ao centro.

Por seu turno, como não podia deixar de ser, António Costa também veio a público mandar a sua farpa. Apesar de afirmar que se obriga a bastante “recato” no comentário à liderança do atual secretário-geral, Costa considerou que não basta “ganhar poucochinho”. Ou seja, o maior fantasma que a atual liderança socialista possui não conseguiu deixar de sublinhar o patamar elevado de responsabilidade que António José Seguro tem pela frente. E como bom fantasma que é, António Costa voltou a socorrer-se da postura que o tem caracterizado nestes últimos anos: um habilidoso toca e foge.

Por último, neste mesma semana também vieram a público as reuniões que Mário Soares tem feito com os mais diversos setores conhecidos pela sua relativa oposição à liderança socialista. O histórico líder socialista nunca escondeu a sua pouca empatia com o atual secretário–geral, tendo sempre desenvolvido uma crítica cerrada pela esquerda à atual liderança. Agora já o faz reunindo sem disfarçar diversos setores, o que não deixa de ser um novo patamar de oposição interna.

É deliciosa a variedade de críticas que recaem sobre Seguro. César critica-o pela direita, Costa ao centro e Soares pela esquerda. A isto sim chama-se um verdadeiro cerco. Será que o Tó Zé segura-se após as Europeias? Acho difícil, mas a ver vamos…

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Troca-Tintismos



Trocado por míudos, o FMI que até já chegou a ser-nos apresentado como o membro mais bonzinho da troika, exige agora que a sangria continue. O Governo Português, conhecido por querer ir além da troika, prontifica-se agora a dizer que “já chega”. Mas fá-lo no mesmo dia em que, por mero acaso, aprova uma medida acabada de sugerir pelo FMI. Por seu turno, a Europa malvada que nos submeteu a esta terrível intervenção externa, vem agora dizer-nos que foi tudo um tremendo erro.

Momentos de crise como o atual sempre foram propícios a posicionamentos gelatinosos, capazes de criticar hoje o que ontem defendiam fortemente, capazes de elogiar hoje o que ontem desfaziam alegremente. Não é portanto novidade este troca-tintismo permanente. Pelo contrário, ele é o conhecido garante de que tudo seguirá o rumo traçado sem grandes sobressaltos e confusões. 

Também não é infelizmente novidade a confusão, a dificuldade de posicionamento e, em última análise, a desilução total que os cidadãos sentem perante os seus supostos representantes. Como é possível manter a sanidade e a confiança em algo tão manifestamente incoerente?

De qualquer modo, apesar do troca-tintismo ser claro, assumido e reconhecido por todos, a coerência tende a ser vista como uma atitude radical. Algo exótico, marginal até, utilizado sobretudo por uns chatos que por aí andam. Comentários para quê?

Artigo publicado no Esquerda.net

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Disciplina, mas pouco

Os partidos pressupõem sempre alguma disciplina. De qualquer modo, levá-la à letra ou sequer ser-se exigente a este respeito desencadeará sempre visões pouco democráticas internamente. Situações castrantes da liberdade de cada um, do direito a ter opinião própria, de oposição interna, entre outras dimensões. No fundo, a disciplina existe, mas pode e deve  ser quebrada. É mais prudente ser-se bastante flexivel a este respeito. De outro modo, em vez de partidos, teríamos bandos de carneiros.

Este processo de purga interna em curso no PSD é de uma loucura total. A possibilidade de expulsar militantes que apoiaram/integraram outras candidaturas, como António Capucho por exemplo, é totalmente doentio. Já sabíamos que o poder ataca facilmente as cabeças menos arejadas. Mas ver um partido com a experiência do PSD a fazê-lo roça o inacreditável.

Miróbolante

Percebo que termos uma semana inteira a discutir Miró foi, no mínimo, insólito. Percebo também que podem existir posições muito diversas e legitimas quanto a mantermos ou não os quadros.

Mas no meio da discussão, surpreendeu-me a quantidade de opinion makers que dizem não entender a importância de mantermos esta significativa colecção em Portugal. Porque ninguém virá a Portugal ver Miró...

Gostemos ou não, Miró é provavelmente um dos pintores do século XX mais conhecidos em todo o mundo. Top 10 seguramente. E os Mirós são sempre cabeças de cartaz em todos os grandes museus de arte contemporânea do mundo, seja no Reina Sofia, no Pompidou, no Tate ou no MoMA.

Podemos achar muita coisa. Mas ter uma colecção destas no Museu do Chiado, em Serralves ou na Gulbenkian não seria um pormenor. Sejamos sérios...

O Mandela da Lusofonia

Boa entrevista de Xanana ao DN. Mais do que as suas considerações sobre a crise Portuguesa e Europeia, que me parecem assertivas mas normais, continua a surpreender-me a sua serenidade. Uma serenidade, uma tão grande vontade de paz, de cooperação, de fraternidade vinda de um ex-guerrilheiro que sentiu e sofreu na pele a resistência não é algo que passe despercebido. Grande Xanana.

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Ah, antes que me esqueça

Acho a história do sorteio das facturas uma bimbalhice inacreditável. Ainda me custa acreditar que uma das grandes apostas da política nacional de fuga aos impostos assenta num concurso de facturas que habilitam o cidadão a um carro. De grande cilindrada, note-se! L-I-N-D-O!

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

What the fuck is praxe?

Ontem consegui ver em diferido o famoso Prós&Contras sobre as praxes. Fiquei comovido. Comovido por ter ficado a saber que aquilo que todos pensávamos ser praxe, afinal não é considerado praxe pelos defensores das praxes. Ou seja, não é praxe a subalternização dos novos alunos, não é praxe colocá-los de quatro, não é praxe pintar lhes a cara e atirar lhes farinha e ovos para cima, não é praxe obrigar-lhes a limpar casas de banho ou medir campos de futebol com palitos. Também não é praxe obrigá-los a fazer figuras tristes.

Tudo o que o documentário Praxis mostra, e que podemos hoje ver quando nos aproximamos de qualquer universidade no principio do ano lectivo, não é praxe. Ah, e esqueçam lá essa coisa dos códigos de praxe porque isso também não é praxe.

Mas afinal, o que raio é a praxe? What the fuck is praxe, perguntamos nós? Pelos vistos, a praxe para os defensores da praxe limita-se a umas aulas fantasmas e a ditar umas bibliografias em latim. Fazer serenatas e usar o traje é praxe. Mostrar aos novos alunos as instalações da nova faculdade, os núcleos desportivos e culturais que possui, isso sim é a verdadeira praxe. Fiquei comovido, a sério.

Hoffman

Hoffman remete-nos fatalmente para grandes filmes. Lembro-me sempre do seu deliciosamente perturbante papel em "Happyness". O filme passou algo despercebido, mas recomendo vivamente a quem nunca viu. É bem capaz de estar no meu Top 10 de filmes.

O oráculo italiano?

Em Itália, com o aproximar das Europeias, o Grilismo surpreende cada vez mais, com insultos e até violência no parlamento. Vale tudo, e Beppe Grillo assume-o, no que já é apelidado de "pornopopulismo".

Itália continua a ser um oráculo do caminho do possivel colapso dos sistemas políticos democráticos, tal como os conhecemos nos dias que correm. Apesar de ser um dos países do G8, a fragilidade do seu sistema político é evidente.

O seu sistema partidário colapsou há uns anos atrás, mostrando estar saturado de um centrismo que não respondia às espectativas do eleitorado. Deu origem a uma multiplicidade de forças políticas difíceis de enquadrar num eixo simples de Esquerda vs Direita. No meio da barafunda de partidos, surgiu então Berlusconi, um fenómeno difícil de compreender num país com o nível de desenvolvimento de Itália. Como se Berlusconi não fosse já pornográfico numa democracia, eis que surge Beppe Grillo, o derradeiro carrasco.

O caso italiano devia ser melhor estudado e entendido como um verdadeiro aviso. Já todos sabíamos que a democracia não é o fim da história. Mas o caminho da sua degradação é uma caixinha de surpresas, como o caso italiano muito bem demonstra.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A Esquerda devia aprender com a Direita


O país ficou a saber na semana passada a impossibilidade de um entendimento entre o Bloco de Esquerda, o Manifesto 3D, o Partido Livre e a Renovação Comunista. Após algumas notícias desgarradas na comunicação social, temos já um facto consumado. O problema é que poucos são aqueles capazes de esclarecer cabalmente as razões desta falta de entendimento. Entre explicações personalistas (ex: o Bloco não gosta do Rui Tavares) e explicações mais estruturais (ex: o Bloco não podia apoiar a proposta do 3D de formação de um novo partido que desaparecia após as eleições), tudo não passam de motivos parciais e nebulosos. E, sobretudo, são explicações exotéricas para um eleitorado que não tem tempo a perder com detalhes da “vida privada” da esquerda portuguesa.

O tema da união de esforços à esquerda em Portugal não é novo. É pelo menos tão antigo quanto a nossa democracia. E as razões desta desunião são muito diversas, existindo variadas teorias a este respeito. Algumas consideram que a base leninista dos partidos à esquerda do PS, que determina que cada um deles se considere a única verdadeira vanguarda política, impossibilita entendimentos eleitorais ou programáticos mais profundos. Outras teorias sublinham que, desde o período de transição para a democracia (1974-1976), o conflito político-ideológico não se faz entre a esquerda e a direita, mas sim entre o CDS-PSD-PS e a restante esquerda. Ou seja, existe uma muito maior divergência ideológica entre o PS e a sua esquerda, do que entre o PS e a sua direita. A meu ver, esta é uma explicação muito mais consistente, existindo alguns estudos académicos que assim o demonstram. 

De qualquer modo, seria de esperar que, passados quase 40 anos de democracia, as raízes de tal desunião passassem a ser coisa do passado. Que as velhas cicatrizes estivessem ultrapassadas, que os olhos estivessem postos no futuro com o necessário realismo que o presente exige. Mas não.

Neste sentido, também não é novo dizer-se que a esquerda tem muito a aprender com a direita política. Ao longo dos quase quarenta anos de democracia, sempre assistimos a uma grande capacidade de aproximação do PSD e do CDS. Mas não só. A criação de coligações eleitorais com pequenos partidos como o MPT ou o PPM também não são uma novidade.. A direita sempre teve uma relativa facilidade em colocar na gaveta as velhas divergências, encontrando pontes comuns que sustentem alianças eleitorais. E os resultados estão à vista, sendo o presente Governo um bom exemplo a este respeito. Na nossa democracia, não foram aliás raras as vezes em que, sendo a esquerda eleitoralmente maioritária, a impossibilidade de entendimento determinou que a direita fosse preponderante.

Como é evidente, acho que a esquerda apenas devia aprender com a direita no que ao pragmatismo diz respeito. O verdadeiro problema em diversos setores da esquerda é que cada pessoa pensa de mais pela sua cabeça. Pensa tanto pela sua cabeça, que as dificuldades de alinhamento são difíceis. A mínima discordância ideológica ou estratégica acaba por ser a razão que impossibilita qualquer alinhamento. O puritanismo mostra-se então em todo o seu esplendor.

No meio de tudo isto, o eleitorado olha para esta sempre ativa (mas confusa!) esquerda portuguesa com alguma apreensão. Como é possível que não se consiga entender? Nem sequer entre a esquerda à esquerda do PS? Não tenhamos dúvidas que esta esquerda à esquerda do PS acabou de dar um mau sinal a este eleitorado. Resta esperar que as reações negativas sobre tal falta de entendimento obriguem a um maior empenho em aproximações futuras. Não sendo possível uma frente eleitoral para as Europeias, comece-se pelo menos a trabalhar desde já em entendimentos capazes de crescer até às Legislativas de 2015.

Artigo ontem publicado no Açoriano Oriental

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

As Jotas

Começo a ficar cansado de citar Pacheco Pereira, mas aqui vai mais uma... Escreve este fim de semana no Público sobre como as Jotas do PS e PSD penetram nos aparelhos governamentais (dos gabinetes às empresas públicas, passando pela Administração Pública), e como levam a cultura do profissionalismo político para estas entidades. Uma boa análise, sem dúvida.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Eu é que sou a verdadeira vanguarda

Bom artigo de São José Almeida no Público de ontem. Atribui  a falta de unidade da esquerda em Portugal a mais um factor: o Leninismo que ainda faz muita escola na esquerda à esquerda do PS. Ou seja, cada força política continua a considerar-se como a grande vanguarda que conduzirá sozinha as massas ao socialismo. Já tinha ouvido diversas teorias sobre esta falta de unidade (nomeadamente o fosso criado em 74/76 entre o PS e a restante esquerda). Confesso que esta não deixa de ser interessante, se consumida com moderação.