O caso BES vai a meio e já vemos um novo gigante nacional em profundo risco de colapso. Sem que nos apercebêssemos muito bem como, a Portugal Telecom, uma das empresas nacionais mais emblemáticas passou a estar profundamente em risco. Contagiada pelo caso BES, subitamente os seus accionistas internacionais começaram a encará-la como um peso, como algo passível de ser alienado, cujos activos deviam ser vendidos. Mas como chegamos a uma situação destas? Como é possível que, num quase estalar de dedos, um gigante caia assim sem mais?
Para que tenhamos bem presente, a Portugal Telecom é de longe a maior empresa tecnológica nacional. A sua preponderância no mercado das telecomunicações nunca deixou de se fazer sentir, mesmo depois da privatização, mesmo quando entraram novos grandes operadores no mercado, mesmo com o desmembramento que daria origem à actual NOS. A PT manteve-se sempre como a grande referência nacional nestes domínios. Beneficiando sem dúvida da posição de anterior operador público único, não se pode no entanto dizer que a empresa andou todos estes anos apenas a gozar os seus privilégios. Pelo contrário, nunca deixou de surpreender nos mais diversos domínios, seja com o seu pólo de investigação em Aveiro, lado a lado com a Universidade, seja através de produtos como o Mimo, o Sapo, ou o MEO, amplamente reconhecidos a nível internacional pelo seu carácter inovador.
E como demonstração desde sucesso que se fazia sentir a nível nacional, a PT é também uma carta de apresentação do país nos diversos países de língua portuguesa. Em África, a sua presença faz-se tipicamente sentir através de participações ou cooperações estreitas com os grandes operadores nacionais. Mas foi no Brasil, com a Oi, que se abriu o gigantesco mercado da América Latina, tendo esta operadora rapidamente assumido o estatuto de gigante em todo o continente.
Mas com todo este “glorioso passado e passado”, o que subitamente se passou com o gigante Português das telecomunicações? Os seus produtos deixaram de ter saída? As vendas baixaram? A empresa não conseguiu acompanhar o ritmo da inovação tecnológica em curso? Estas interrogações fariam sentido num mundo em que o futuro deste tipo de grupos económicos dependesse de facto das suas vendas e desempenho no seu sector. Mas nos dias que correm, com a exposição aos mercados bolsistas, com accionistas cada vez mais variados e apenas interessados na valorização a todo o custo das suas acções, as vendas, a capacidade de inovação e o desempenho no sector são apenas um detalhe da sua presença no mercado. Aliás, o facto da PT estar sobretudo a ser colocada em causa pela compra de uma dívida a um seu accionista – O BES – demonstra isso mesmo. Ou seja, são os grandes negócios, as grandes operações nos mercados financeiros que conseguem levar estes gigantes ao tapete com um quase estalar de dedos.
Resta saber se, tendo em conta a dimensão deste tipo de empresas e o seu papel em sectores estratégicos, estas devem de facto ser deixadas assim ao bom sabor dos mercados. A sua progressiva privatização aumenta naturalmente a sua exposição, chegando-se rapidamente ao ponto em que estamos: Portugal na eminência de perder uma das suas maiores jóias da coroa sem que o Estado possa fazer grande coisa a este respeito. Vêm-nos agora à memória os grandes apologistas para que se acabasse rapidamente com a golden share que o Estado tinha na PT.
Hoje, já todos atiram pedras a Zeinal Bava e a Henrique Granadeiro, ainda ontem encarados como a fina flor da gestão Portuguesa. Hoje já são muitos os que apontam as más práticas de gestão da PT e o quando devemos aprender com este fracasso. Da minha parte, prefiro aprender que o Estado não deve abrir levianamente a mão de empresas nacionais que lideram sectores estratégicos. Eis uma das grandes lições que tiro de todo este processo. E, já agora, gostaria que este exemplo da PT fosse tido em conta quando andamos a discutir o futuro dos CTT, da TAP ou de outros gigantes nacionais na mira da privatização.