terça-feira, 9 de agosto de 2011

2400 milhões de razões para estarmos furiosos

Ora recapitulemos então. O BPN, um banco que desde sempre fora associado a um círculo próximo do ex-primeiro ministro e então Presidente da República Cavaco Silva, correu o risco de entrar em falência nos finais de 2008. Com a crise económica em curso e seguindo o (mau) exemplo de outros países, o Estado Português partiu às cegas para a sua imediata nacionalização, deixando de fora a sociedade que gere o grupo – a SLN – que até tinha activos preciosos. Muito rapidamente o país apercebe-se então que o banco era pessimamente gerido e que, para além dos inúmeros crimes cometidos pelos seus administradores, o buraco financeiro que possuia vislumbrava-se enorme. Ou seja, nacionalizou-se um prejuízo que estava então longe de poder ser estimado.

E como se tal já não fosse em si mesmo muito grave, aos poucos foi-se percebendo que a proximidade do Presidente da República ao BPN não era assim tão pouca. Um dos ex-adminstradores do Banco e principais suspeitos – Dias Loureiro – foi um dos membros do Conselho de Estado nomeados por Cavaco Silva, o que demonstra bem a proximidade e as relações de confiança existentes. Por outro lado, a casa de férias do Presidente da República fica nem mais nem menos naquela que é conhecida como a aldeia BPN. E por último, questão não menos importante, o então ex-primeiro-ministro comprara em 2001 acções do Banco a preço de saldo, garantindo com a sua venda dois anos depois um lucro de 140% (147 mil euros). Um negócio da China, portanto. O BPN é assim um caso que circunda Cavaco Silva e cujas explicações dadas até hoje não permitiram ainda uma descolagem política total perante o sucedido.

Passados poucos anos da polémica ter estalado, o responsável máximo do banco está detido, mas todos os restantes membros da sua administração estão em liberdade. Descobriu-se entretanto (pasme-se) que Dias Loureiro, que consta estar em Cabo Verde, não tem mais do que 5000 € nas suas contas para penhorar. Comentários para quê?

E agora, fruto do compromisso com a troika de privatizar imediatamente o BPN, o banco foi ruinosamente vendido por 40 milhões ao BIC, tendo o Estado Português perdido com esta operação um total de 2400 milhões de euros. Repito: 2400 milhões pagos por todos nós. Curiosamente ou não, o banco é adquirido por um grupo angolano liderado por Mira Amaral, outro ex-ministro de Cavaco Silva.

Embora este seja o maior rombo económico de sempre de que foi alvo o Estado e os contribuintes portugueses, o caso está longe de merecer a devida atenção e dele se retirarem as devidas ilacções. Por um lado temos um partido do Governo e um Presidente da República altamente desconfortáveis devido à proximidade com alguns dos principais suspeitos. Por outro lado, temos um PS que receia que a exploração excessiva do assunto também lhe seja prejudicial. Afinal de contas, goste-se ou não, foi o anterior Executivo que avançou para a desastrosa nacionalização.

E é no meio deste cenário que os Portugueses vão a banhos, tão extenuados pela crise e pelo cenário negro em que se encontram que quase se esquecem de exigir responsabilidades. Existindo 2400 milhões de razões para estarem furiosos, o mínimo que se pede é que este caso BPN não caia no esquecimento. Como referência sobre a dimensão do problema, o polémico imposto extraordinário sobre os subsídios de Natal apenas renderá aos cofres do Estado cerca de 1025 milhões de euros. Representa portanto menos de metade do necessário para pagar o prejuízo do negócio BPN. Que este caso sirva para reflectir a impunidade que se vive nos altos círculos do país e o seu peso no bolso de cada um de nós.

Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
(Imagem: CDU Arouca)

3 comentários:

João Roque disse...

Pois é, o senhor Silva, bem no meio do ciclone chamado BPN!
Só não vê quem não quer ver, mas ele assopra para o lado...

Diogo disse...

Na revolução que aí vier, a violência terá de ser dirigida cirurgicamente contra os responsáveis da actual situação: banqueiros, políticos, jornalistas, juízes e outros. Nada de embates contra a polícia de choque, nada de grandes manifestações, nada de partir montras e carros, nada de espatifar lojas…

aNaTureza disse...

Por enquanto, dá mais jeito ser "esquecido"...até ao dia que perceberem que já deviam ter feito alguma coisa, mas qdo aí chegarem, irão ver que andaram a viver num mundo de "faz de conta" e que não terão acesso ao prometido mundo e ao que ambicionaram.
O que é incrível, é que ainda não perceberam...haja lentidão.