Os resultados das presidenciais vieram confirmar alguns traços no sistema partidário que se fizeram sentir nas últimas legislativas. Se à direita o equilíbrio de forças não parece ter-se alterado significativamente, à esquerda o status quo entre o PS, o Bloco e o PCP está muito longe do que existia há apenas um ano atrás.
Como é típico no mundo do comentário político, multiplicam-se agora os prognósticos sobre o futuro. E são assumidos por vezes de forma tão determinista ou fatalista como se não existisse um passado que nos trouxe até aqui. E sobretudo, são prognósticos feitos assumindo que a luta política nos dias que correm é algo linear, perfeitamente previsível, onde o inesperado raramente acontece. Vejamos alguns destes prognósticos.
O PS corre o risco de desintegrar-se – Apesar de não ser consensual, ouvimos este tipo de prognóstico por estes dias de vozes tão diferentes como o Vasco Púlido Valente, a Clara Ferreira Alves ou a São José Almeida. É verdade que o PS vem de sucessivas derrotas eleitorais e de lutas internas particularmente corrosivas. É verdade também que hoje o seu governo assenta num conjunto de compromissos e num equilíbrio de forças particularmente desafiantes. Mas não é menos verdade que o facto de liderar hoje o Executivo do país não só acalma imediatamente as hostes internas, como concede ao partido o palco e instrumentos privilegiados para bem definir o seu futuro. Nos últimos 40 anos, o PS já atravessou diversos momentos bastante mais difíceis do que o actual. Basta recordar os 10 anos de Cavaco no Governo e os danos que causaram no Largo do Rato. O PS conseguiu inúmeras vezes erguer-se quando conseguiu aliar uma liderança carismática com oportunidades conjunturais. Não há razão nenhuma para achar que hoje tal cenário não é possível ou até o mais previsível.
O Bloco está a ocupar um novo espaço político – Os dois últimos resultados eleitorais demonstram que o partido está com saúde e recomenda-se. Tem conseguido transformar o que até há um ano atrás era uma posição extremamente vulnerável numa oportunidade impar de demonstração de solidez, de inteligência política e de responsabilidade até. E o eleitorado tem reconhecido e valorizado este novo posicionamento do Bloco. No entanto, importa não esquecer que continua a ser um partido relativamente recente, com uma limitada estrutura militante e particularmente vulnerável a flutuações eleitorais. Os últimos tempos têm sido extremamente positivos, mas assumir que assim continuará de forma quase inevitável implica ignorar todo o historial do Bloco.
O PCP está em declínio acelerado – A derrota nas últimas presidenciais foi particularmente dura. Os comunistas desceram vertiginosamente em alguns dos bastiões, levando-os a um dos piores resultados de sempre. Também é evidente que o bom resultado do Bloco veio trazer um nervosismo adicional à Soeiro Pereira Gomes. Mas assumir que estamos perante um declínio sem retorno do PCP implica uma manifesta ignorância sobre a base de militância dos comunistas, assim como o que se passou nos últimos anos. Desde a queda da URSS, a certidão de óbito ou de insignificância dos comunistas já foi passada diversas vezes. E o que é que aconteceu? O PCP conseguiu sempre uma forte resiliência política, apoiada quer na sua fortíssima base militante, quer pela sua força sindical que possui, quer pela sua capacidade de penetração no poder local. Em modo Mark Twain, podemos dizer que as notícias sobre a morte do PCP são manifestamente exageradas.
Tendo em conta a pouca previsibilidade da luta política, cujo cenário governativo que hoje vivemos em Portugal é dos mais emblemáticos, importa mais do que nunca lembrar a velha máxima do grande intelectual João Pinto: “Prognósticos só no fim do jogo”.
Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
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