O LIVRE/TEMPO DE AVANÇAR foi um dos grandes derrotados da noite eleitoral. Eleger dois deputados não era deslumbrante, mas seria um bom resultado. Eleger um deputado era o mínimo dos mínimos. Não eleger, não chegar sequer aos 1% e ficar-se pelos 40 000 mil votos foi um murro no estômago. Sobretudo para quem, como eu, empenhou-se fortemente nesta candidatura. Uma derrota pesada. Demasiado pesada.
Como foi possível? Com tantos notáveis a apoiar, com gente qualificada e de áreas e quadrantes diversos envolvida? Com um programa eleitoral notável?
O que correu mal?
Poderia apontar várias mãos cheias de explicações que contribuíram para o mau resultado: 1) a inexperiência e débil implantação de uma candidatura que nasceu há poucos meses; 2) o desempenho extraordinário de um partido com quem disputa parte do eleitorado (o Bloco); 3) a eficácia duvidosa nos métodos utilizados, como as primárias para escolha de todos os candidatos, elaboração conjunta do programa eleitoral. E muitas outras explicações poderiam aqui ser enumeradas.
Mas destacaria uma dimensão que me parece preponderante: para uma candidatura tão recente, movendo-se num terreno tão competitivo e dirigindo-se a uma fatia do eleitorado tão exigente, faltou-lhe foco na comunicação externa. Faltou-lhe uma mensagem forte, clara, simples e distintiva que, repetida até à exaustão, pudesse ter ganho espaço na agenda da campanha e concedesse a notoriedade necessária ao LIVRE / TEMPO DE AVANÇAR. Paulo Portas passou a campanha a repetir até à exaustão que o Governo devolveu a independência ao país, Passos insistiu na retoma, Catarina Martins fundamentou bem porque era contra a austeridade ao mesmo tempo que abriu as portas a um entendimento com o PS.
Faltou ao LIVRE / TEMPO DE AVANÇAR uma mensagem que o permitisse distinguir inequivocamente das restantes forças políticas, assumindo-se como a sua carta de apresentação. O facto de ser uma candidatura inovadora, com primárias abertas e com um programa elaborado colaborativamente é algo muito positivo, mas pouco eficaz em termos comunicacionais no contexto atual. A unidade à esquerda pode ser bem explorada, mas não deixa de ser um tema difícil de explicar, sobretudo quando outros a utilizam também, embora em modo bullshit.
Não conseguímos impor-nos no muro da informação e desinformação de uma campanha particularmente agressiva.
O que correu pior?
Numa eleição em que várias forças políticas concorreram pela primeira vez, por mais estruturado e fundamentado que fosse o nosso programa, por mais competentes e reconhecidos que fossem os nossos candidatos, o LIVRE / TEMPO DE AVANÇAR foi imediatamente colocado no campeonato dos “outros”. E este campeonato é totalmente diferente, a começar na cobertura mediática que as várias forças políticas têm acesso.Por mais estéril que fosse a sua acção, PàF, PS, Bloco e CDU tinham sempre garantido o seu espaço na comunicação social. Em todas os jornais, rádios e TVs, entrevistas ou debates, os partidos com assento parlamentar beneficiaram de um estatuto invejável em termos de exposição. Não estou assumir que é uma injustiça que assim seja. Apenas constato um facto.
Pelo contrário, os “Outros” tiveram sempre que correr por fora. Sem cobertura garantida, sem meios para grandes acções, o campeonato foi de facto outro, tornando-se particularmente difícil passar a mensagem a um eleitorado já confuso e cansado de tanta proposta, de tanto logotipo, de tantas novidades. Mesmo o eleitorado mais esclarecido tinha dificuldade em não confundir o LIVRE/TEMPO DE AVANÇAR com o AGIR ou outras forças políticas como o “Nós Cidadãos”. Quando assim é, estamos ainda próximos da estaca zero da comunicação, i.e., o eleitorado saber que existimos e conseguir-nos distinguir minimamente de outras forças políticas.
Para furar este cerco de comunização, uma das hipóteses fortes passa por desenvolver acções de marketing viral ou de guerrilha. Ações que, com o timing perfecto e com o ângulo certo, podem fazer mais do que dezenas de arruadas ou de sessões de esclarecimento. Entregar caixas de pizzas com programas eleitorais foi um bom exemplo a este respeito.
Os detalhes que fazem a diferença
O cenário acima seria catastrófico para a maioria das forças políticas. Mas alguns pequenos detalhes deverão ser tidos em consideração antes de se ditarem sentenças fatais e as inevitáveis certidões de óbito que sempre surgem nestes momentos. Quando se faz política por genuína convicção, de forma descomprometida, como expressão de activismo e de urgência social, não é fácil desmobilizar. Precisamente porque cada derrota sublinha ainda mais a necessidade e urgência de seguir em frente. E tal acontece sobretudo quando estamos muito confortáveis e admiramos quem nos acompanha, quando estamos absolutamente convencidos sobre o que nos move e quando acreditamos na estratégia seguida.
O LIVRE / TEMPO DE AVANÇAR foi arrojado a todos os níveis. Fez tudo o que “os manuais” não recomendariam que fizesse nesta fase. Arrancou com um congresso fundador onde qualquer cidadão pôde participar ativamente. Escolheu todos os seus candidatos a deputados através de primárias diretas. Desenvolveu o seu programa eleitoral com base num processo participativo aberto a todos os cidadãos.
Esse arrojo permitiu-lhe trazer para junto de si cidadãos de quadrantes muito diferentes da esquerda política. Gente que nunca tinha tido qualquer envolvimento político, outros que o deixaram de ter há muito, outros ainda (o meu caso) que encontraram aqui as vontades para fazer algo verdadeiramente diferente. Esta candidatura foi construída do zero, com o esforço de cada um, sem directórios, tendências ou eminências pardas a apontar o caminho. Algo genuíno e profundamente inovador. Não é fácil mandar algo assim abaixo. Nem mesmo um péssimo resultado eleitoral
Desengane-se quem acha que este é um movimento de notáveis. É possível que sejam “apenas” cidadãos com vontade de mudar o país e, porque não, o mundo. Coisa pouca, portanto.
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