José Contente oficializou no passado Sábado a sua candidatura à presidência da Câmara de Ponta Delgada. Com o forte apoio dos presidentes do PS Açores, o ex-secretário regional apresentou a sua ambição para a cidade, governada há 20 anos pelos sociais-democratas. Tal como já tive oportunidade de sublinhar anteriormente, inclusive neste espaço, a permanência de um partido no poder por longos períodos acarreta inúmeros vícios. Neste sentido, uma mudança de cor política em Ponta Delgada poderia ser uma forma de arejar o executivo municipal, trazendo novas dinâmicas e abordagens, novas ideias, novas prioridades e até novas caras.
No entanto, a candidatura com elevado potencial vencedor agora apresentada por José Contente acaba por apresentar um baixissimo “potencial de arejamento”. Ou seja, diversos fatores limitam à partida a sua capacidade para representar uma mudança de facto para a cidade. Comecemos pelo posicionamento do executivo da cidade relativamente ao Governo da região. Ponta Delgada é hoje um dos poucos concelhos açorianos que ainda não é dominado pelo PS. E o facto de Berta Cabral ter utilizado o concelho para competir com o poder regional está longe de ser necessariamente mau. Pelo contrário, este tipo de competição tipicamente beneficia os próprios municípes, que são assim particularmente “acarinhados” por um autarca que se quer diferenciar do quadro político circundante. Ganha também a democracia na região por ter na maior cidade do arquipélago um contrapeso ao partido dominante.
Mas o factor acima acaba por se revelar secundário quando temos em conta o perfil e currículo do actual candidato socialista à autarquia. Falar de renovação em Ponta Delgada e apresentar José Contente é no mínimo paradoxal. José Contente é um dos mais antigos rostos do Governo PS na Região. Foi Secretário Regional nos últimos 16 anos, período durante o qual foi quase sempre considerado o braço direito de Carlos César. Complicado seria encontrar alguém com tanta rodagem como José Contente. Aliás, será particularmente interessante acompanhar o debate eleitoral em Ponta Delgada. Contente colocar-se-á naturalmente como challenger, questionando a obra do PSD na cidade e o que teria feito melhor. Acontece que Contente foi ele mesmo o super-Secretário Regional das Obras Públicas, sendo pouca a obra do Governo Regional que não tenha passado pela sua mão, nomeadamente em Ponta Delgada.
Se a isto somarmos o facto deste desafio de Ponta Delgada surgir na sequência de um delicado processo de sucessão PS, ficamos com a série impressão de que se trata de uma candidatura que resulta de uma espécie de negociação palaciana que a todos os delfins procurou agradar. Vasco Cordeiro ficou com a Presidência do Governo, Sérgio Ávila ficou como super-secretário, José Contente ficou com Ponta Delgada e Carlos César conseguiu o magnífico feito de continuar a ser presidente do PS Açores. Um bonito quadro, apoiado mais uma vez por um unanimismo que reflete bem o nível de debate interno que deve existir no PS Açores.
Num momento em que tanto se discute a limitação dos mandatos dos autarcas, e a legitimidade destes se candidatarem ou não ao concelho ao lado, temos aqui o exemplo do “velho” governante que aspira agora a ser autarca. E que quase de certeza ganhará, tendo em conta a fraquíssima notoriedade do seu adversário. Estamos contentes com a candidatura do PS a Ponta Delgada? Na minha humilde opinião, o PS tem nas suas fileiras quadros bem mais novos e arejados do que José Contente. É pena que não os aproveite, procurando pelo contrário presentear quem neste momento ganharia em fazer uma saudável sabática no exercício de cargos públicos.
Artigo hoje publicado no Açoriano Oriental
(Imagem: PS Açores)
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