Por entre anúncios quase diários de novas medidas de austeridade, foi comunicada na passada semana a decisão de que se procederá ao encerramento das escolas com menos de 21 alunos. A medida abrangerá cerca de 900 escolas a nível nacional e implicará a deslocação de cerca de 15 000 crianças para centros escolares de maior dimensão. Foi desde logo sublinhado pelo Ministério da Educação que a medida se enquadra num esforço de promoção da qualidade do ensino. Segundo a tutela, os alunos de escolas de reduzida dimensão possuem taxas de reprovação muito superiores à média nacional. O encerramento de tais estabelecimentos apresenta-se, assim, como uma medida que visa proporcionar aos alunos em causa a integração em escolas de maior dimensão que disponham de equipamentos fundamentais como bibliotecas, cantinas, entre outros, considerados essenciais a um maior sucesso escolar.
E é logo aqui que a linha argumentativa quebra bruscamente. Como se a dimensão de uma escola fosse a única variável explicativa do insucesso escolar. Ou como se pudesse ser encarada como variável determinante de um fenómeno cuja complexidade é infelizmente bem conhecida. Não é necessário ser-se grande adivinho para se ter a certeza que tal medida atingirá sobretudo zonas do país já seriamente afectadas pelo envelhecimento da população e desertificação. Não será portanto no litoral populoso e mais desenvolvido que tudo se fará sentir, mas sim nas regiões que tradicionalmente já possuem problemas estruturais há muito identificados nos mais diversos indicadores sócio-económicos.
Os paradoxais objectivos de poupança por detrás do encerramento de escolas surgem então à vista de todos. Porque quando se trata de fazer auto-estradas, vias rápidas ou outros projectos que visam trazer a “modernidade” para o “interior pobre e esquecido” do país, aí não há quem não goste de ser o campeão da solidariedade para com as regiões mais deprimidas. O investimento público surge como instrumento central para quebrar o isolamento de tais regiões, sendo quase heresia questionar a viabilidade ou o retorno do mesmo. Mas quando se trata de fazer um esforço adicional para manter escolas, estruturas centrais para a qualidade de vida local e pólos dinamizadores de tais meios, aí tudo parece ser mais complicado. Aí já todas as dúvidas surgem quanto à viabilidade de tal investimento. É triste que assim aconteça.
É lamentável assistir a uma política educativa que parece apenas confiar nos números para a sua tomada de decisão, ignorando assim realidades tão facilmente percepcionadas pelo senso comum. Ignora-se, apenas a título de exemplo, que deslocar crianças do primeiro ciclo - normalmente entre os 6 e os 9 anos – e submetê-las a deslocações de quilómetros de autocarro escolar rumo à sede de concelho é uma espécie de retrocesso civilizacional. Um regresso às realidades de outros tempos, em que o estudar era valorizado apenas pelos mais persistentes.
Num momento em que o esforço em prol do desenvolvimento e da própria coesão do território deveria passar por ampliar a rede escolar, proporcionando um tipo de ensino menos massificado, com turmas mais pequenas, com modelos de aprendizagem mais flexiveis, mais adaptados às diversas realidades, assistimos precisamente ao inverso: uma lógica centralizadora com inegáveis objectivos de poupança. No país onde todos os problemas de desenvolvimento vão sempre dar ao modelo de ensino e à estrutura de qualificações da população, o anunciado encerramento de 900 escolas apresenta-se como um tremendo passo atrás.
Artigo publicado terça-feira no Açoriano Oriental
Sem comentários:
Enviar um comentário