A candidatura de Fernando Nobre à Presidência da República é uma surpresa que origina sentimentos contraditórios. O currículo do presidente da AMI é inequívoco. A sua verticalidade e seriedade garantem que a candidatura que agora apresenta seja naturalmente forte. O capital de simpatia que foi recolhendo e a consideração que merece em diversos quadrantes políticos, nomeadamente ao longo de toda a esquerda, tornam-no um candidato com grande potencial.
No entanto, a sua candidatura proporciona igualmente óbvios dissabores: o indiscutível valor do candidato proporcionará a divisão do eleitorado de esquerda que tanto se procurava evitar. Proporciona-nos assim uma espécie de sorriso amarelo desconcertante. Num momento em que toda a convergência parece pouca para travar as gigantescas probabilidades de reeleição de Cavaco, eis que surge uma segunda candidatura no campo da esquerda que não deixa antever nada de bom.
Poder-se-á argumentar que a candidatura de Nobre é tão legítima como a de Manuel Alegre, não devendo recair sobre o primeiro o ónus de estar a dividir a esquerda. Tal é mais do que defensável. Mas o pragmatismo do momento presente exigia que se evitasse a multiplicação de candidaturas do mesmo espaço político. Candidaturas que, para além de fraccionarem o eleitorado, acabem por se desgastar mutuamente.
Por outro lado, o pragmatismo do momento presente exige que os esforços sejam direccionados não para encontrar o candidato perfeito, mas sim o candidato com melhores condições para, através de uma união à esquerda, conseguir ameaçar seriamente Cavaco. Neste sentido, julgo difícil considerar que Nobre poderá competir com o reconhecimento e notoriedade pública que uma figura como Alegre já possui.
Mas o maior risco que assombra a candidatura do presidente da AMI é a instrumentalização de que poderá ser alvo pelos sectores do PS que poucas simpatias nutrem por Alegre. Caso as duas candidaturas prossigam sem espaço a entendimentos e aproximações, os dados estão lançados para que o divisionismo da esquerda crie as condições perfeitas para que Cavaco possa continuar a dormir descansado com as suas favas muito bem contadas.
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