domingo, 21 de fevereiro de 2010

Sorriso Amarelo

A candidatura de Fernando Nobre à Presidência da República é uma surpresa que origina sentimentos contraditórios. O currículo do presidente da AMI é inequívoco. A sua verticalidade e seriedade garantem que a candidatura que agora apresenta seja naturalmente forte. O capital de simpatia que foi recolhendo e a consideração que merece em diversos quadrantes políticos, nomeadamente ao longo de toda a esquerda, tornam-no um candidato com grande potencial.

No entanto, a sua candidatura proporciona igualmente óbvios dissabores: o indiscutível valor do candidato proporcionará a divisão do eleitorado de esquerda que tanto se procurava evitar. Proporciona-nos assim uma espécie de sorriso amarelo desconcertante. Num momento em que toda a convergência parece pouca para travar as gigantescas probabilidades de reeleição de Cavaco, eis que surge uma segunda candidatura no campo da esquerda que não deixa antever nada de bom.

Poder-se-á argumentar que a candidatura de Nobre é tão legítima como a de Manuel Alegre, não devendo recair sobre o primeiro o ónus de estar a dividir a esquerda. Tal é mais do que defensável. Mas o pragmatismo do momento presente exigia que se evitasse a multiplicação de candidaturas do mesmo espaço político. Candidaturas que, para além de fraccionarem o eleitorado, acabem por se desgastar mutuamente.

Por outro lado, o pragmatismo do momento presente exige que os esforços sejam direccionados não para encontrar o candidato perfeito, mas sim o candidato com melhores condições para, através de uma união à esquerda, conseguir ameaçar seriamente Cavaco. Neste sentido, julgo difícil considerar que Nobre poderá competir com o reconhecimento e notoriedade pública que uma figura como Alegre já possui.

Mas o maior risco que assombra a candidatura do presidente da AMI é a instrumentalização de que poderá ser alvo pelos sectores do PS que poucas simpatias nutrem por Alegre. Caso as duas candidaturas prossigam sem espaço a entendimentos e aproximações, os dados estão lançados para que o divisionismo da esquerda crie as condições perfeitas para que Cavaco possa continuar a dormir descansado com as suas favas muito bem contadas.
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Artigo publicado hoje no Esquerda.net

5 comentários:

Ana Paula Fitas disse...

Caro Ricardo,
Gostei muito deste texto. Obrigado.
Abraço.

Anónimo disse...

O problema vão ser aqueles cidadãos militantes e não militantes, que estão fartos dos mesmos políticos e agora têm uma excelente opção.
Sempre a fazer continhas JRV!!! :)
Espero bem que se engane...

Fokas disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fokas disse...

Caro Ricardo,

Estou de acordo com o comentário que já lhe foi feito. "Venho dizer-vos que não tenho medo...a verdade é mais forte que as algemas". Fui um dos Alegrista nas primeiras eleições mesmo denunciando publicamente o patriotismo "poético" que achei completamente exagerado e "demodé"...Fazendo que conta de que não sabia que o candidato tinha sido deputado na Assembleia da República e membro do PS desde sempre! Para além das cenas da caça e outras do mesmo estilo..que não curto. Manuel Alegre sempre me pareceu o melhor candidato para unir a esquerda e tal só não aconteceu pq o Dr. Soares insistiu numa recandidatura apoiada pelo aparelho do PS e o BE resolveu como era da sua natureza apresentar o seu candidato próprio! Erro fatal como hoje todos podem entender..pq nem o pleno fez com essa candidatura e ficou de fora de qualquer negociação possível!
Mas adiante...hoje a candidatura do Dr. Fernando Nobre apesar de dividir a esquerda... vai escolher o melhor candidato para derrotar o Prof. Cavaco Silva!
Eu vou votar no meu candidato de sempre e depois na segunda volta que ganhe o melhor!

Unknown disse...

Eu não estou muito de acordo.

Acho que a existência de dois ou três candidatos na Esquerda enriquece e melhor serve para derrotar Cavaco Silva. Há muita gente que não se deixa unir em torno de Alegre que não terá dificuldades em votar noutro candidato...

E essa coisa da "união" da Esquerda não me parece grande coisa quando é à volta de uma personagem tão sinistra que é o Manuel Alegre.