terça-feira, 21 de outubro de 2008

Comunicação Social Açoriana e Alternância Política

O Público traz hoje um artigo dedicado à tradição de maiorias absolutas nas regiões autónomas. Nos Açores, tal como na Madeira, nunca uma recandidatura de um Presidente do Governo Regional saiu derrotada. Porquê? Açorianos e madeirenses são simplesmente avessos à alternância democrática?

Embora não existam estudos sobre esta temática nas regiões autónomas, algumas explicações conseguem ser avançadas, tal como hoje Pedro Magalhães indica no Público: o peso do sector público na economia regional, a gestão dos recursos públicos pelo partido que governa ou a visibilidade adquirida fruto da governação. Avanço com mais uma hipótese explicativa que valeria a pena ser estudada: a quase ausência de fiscalização política na comunicação social açoriana.
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Centrando-nos no caso dos Açores (uma vez que conheço pouco o panorama madeirense), o número de órgãos de comunicação social até é muito substantivo tendo em conta a dimensão populacional do arquipélago. Muitas ilhas possuem mais do que um jornal, possuem diversas rádios e o arquipélago beneficia de uma estação de televisão – a RTP Açores. No entanto, apesar da proliferação de órgãos de comunicação social, a crítica/fiscalização política não proliferam nos referidos órgãos.
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Os partidos políticos da oposição conseguem naturalmente as suas notícias. Mas o grosso da informação política é feito com base na obra Governamental: “O Governo criou o programa X, o Secretário Y inaugurou Z, o Director Regional A anunciou que…”. A título de exemplo, ao contrário do que acontece numa dimensão nacional, dificilmente conseguir-se-á encontrar uma manchete num jornal açoriano, muito menos na televisão açoriana, que denuncie um qualquer “escândalo” político, uma trapalhada governamental ou mesmo uma promessa descaradamente não cumprida.
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A comunicação social açoriana acaba por funcionar sobretudo como uma caixa de ressonância da obra governativa e raramente como mecanismo de fiscalização política da acção governamental.
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Como é natural, tal não acontece por acaso ou simplesmente porque a comunicação social possa estar explicitamente dominada pelo Governo. Num meio relativamente pequeno (sublinho o “relativamente pequeno”), mesmo a comunicação social ganha pouco/perde muito em incompatibilizar-se com o poder estabelecido. Em meios relativamente pequenos, a fraca fiscalização política da comunicação social é mais um contributo para as parcas tradições de alternância política.

5 comentários:

Anónimo disse...

JRV, não achas um bocado difícil que as notícias de um meio pequena não sejam quase exclusivamente sobre a obra do governo?
Concordo que a comunicação social favorece o governo, mas será que há realmente assim tantos assuntos negativos de uma governância, por outro lado, terá a comunicação social dos Açores meios suficientes para investigar possíveis escândalos?
Eu sinceramente acho que não.
cmps

samuel disse...

E o que torna, talvez, tudo ainda mais difícil para que possam exisistir quaisquer possibilidades de escrutínio, é o facto de um enorme número de pessoas achar o que se passa... normal (ou inevitável), como o caro comentador que me precedeu.

Abraço

Anónimo disse...

Este "post" é fruto de uma falta de atenção aos conteúdos da nossa comunicação social. De facto, é lá que se encontra a verdadeira oposição ao PS. Basta lembrar as denúncias nas áreas do ambiente, saúde, assuntos sociais, etc.
Quem não tem feito o seu trabalho é, sobretudo, o PSD, entretido com o medo, o medo, o medo...
Se Costa Neves tivesse lido os jornais, ouvisse rádio e visse televisão perceberia que quem tinha medo era o eleitorado, mas do PSD...

Anónimo disse...

samuel
não acho que seja "normal", mas sim inevitável. Não sei se alguma vez viveste nas ilhas, mas não há grandes notícias para além daquilo que é feito pelo governo. E obviamente que isso não ajuda a oposição. Vamos lá ver se daqui a 4 anos com uma liderança mais forte no PSD e com outra duvidosa do PS (porque depois de um líder forte vem sempre uma incógnita) as eleições terão o mesmo resultado.

João Ricardo Vasconcelos disse...

Anónimo 1: Sim, acho dificil que não sejam sobre a obra do governo. Mas tal não implica um quase total silêncio sobre questões que podem provocar efectivo desgate ao executivo.

Dou-lhe um exemplo fresquissimo: a questão dos dinheiros atribuidos aos agricultores 3 dias antes das eleições. Não sei qual o relevo que a questão ganhou na comunicação social açoriana. Mas, como concordará, numa comunicação social de âmbito nacional, se o governo da república tivesse uma manobra semelhante a três dias das eleições, falar-se-ia sobre o assunto durante semanas/meses.

Anónimo 2: Admito que possa ser falta de atenção. Não sigo a comunicação social açoriana diariamente. Sei que grande parte da oposição até pode lá estar (e.g. Correio dos Açores, Diário dos Açores, entre outros).

Mas, já agora, peço-lhe que seja um pouco mais explicito. Exemplifique-me dois ou três assuntos que tenham sido agarrados por toda a comunnicação social e que tenham provocado um efectivo desgate nos membros do executivo.

Quanto a Costa Neves, não fez o trabalho de casa. Vitor Cruz também não o fez há 4 anos. E Manuel Arruda também não o fez há oito anos. E, já agora, o PS também nunca fez o trabalho de casa durante 16 anos (1976-1992). Curioso, não é? Os oponentes nunca fazem o trabalho de casa.

Se calhar o problema é um pouco mais estrutural, não acha?