quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Corporações e Deontologias

Julgo não restarem dúvidas que o posicionamento da classe médica em geral, e da sua Ordem em particular, está a condicionar significativamente a aplicação da nova lei sobre a interrupção voluntária da gravidez. Começou com o tsunami de objectores de consciência que varreu o país. Agora, a alteração do código deontológico parece ser o problema.

A Ordem dos Médicos parece não querer abrir mão do artigo 47ª do seu código deontológico que considera a prática do aborto uma falha grave. A este respeito, o bastonário não escondia a sua posição ainda antes do referendo. Agora, mesmo com a pressão do Ministério, mesmo com o parecer inequívoco da Procuradoria-Geral da República, e mesmo reconhecendo que a lei prevalecerá sempre sobre as disposições do código deontológico, o bastionário Pedro Nunes continua convicto que o código não deve ser alterado.

Podemos, sem dúvida, considerar legitimas as convicções pessoais de cada profissional. Podemos também considerar legitima a deontologia baseada em valores tradicionais de uma determinada área profissional. Mas fará algum sentido que a mesma entre em confronto claríssimo com a legislação em vigor, ameaçando penalizar os profissionais que a cumprem? Será pedir muito que a Ordem que representa a classe médica adopte uma postura menos parcial na aplicação da lei da IVG?

8 comentários:

Anónimo disse...

Quando o serviço melitar era obrigatòrio,quem alegasse objecçao de consciencia ,para nao o cumprir ,ficava impedido de trabalhar no estado.Apliquem agora o mesmo aos drs, os objectores ,libertem-nos desse sacrificio que è trabalhar para o estado.

João Ricardo Vasconcelos disse...

Acrescentava que a lógica da Ordem dos Médicos parece assentar na badalada linha de argumentação marceliana:
O médico pode praticar IVGs?
Pode.
E tal está de acordo com a lei?
Claro.
Mas é considerado uma falha grave pelo Código?
Pois...

Anónimo disse...

Na minha opinião quem deve ou não deve alterar o Codigo Deontologico é uma decisão que deve ser tomada pelos médicos e não pelo Sr.Ministro

João Ricardo Vasconcelos disse...

O problema, meu caro A.Silva, é que o Ministro não quer mudar o código por mera teimosia ou afronta à classe médica. É sustentado por um parecer da Procuradoria Geral da República. Ou seja, e contrariamente à retórica da Ordem, a vontade do Ministro aqui até é acessória. Trata-se sim de repor a legalidade.

Em última instância, e dramatizando um pouco, a Ordem não está a afrontar o ministro, mas sim os portugueses. Ainda mais poucos meses depois de um referendo que concordou com a despenalização da IVG...

Diria, no mínimo, que há um excesso de corporativismo que em nada beneficia a imagem da classe médica.

Anónimo disse...

Caro JRV,

subscrevo inteiramente este seu último comentário, que vem reforçar o que está escrito no post.

...é que é mesmo isso.!

Anónimo disse...

Não estou a defender a Ordem dos Médicos mas parece-me que o facto de os Srs.Ministros se meterem nas questões das Ordens e dos Estatutos de determinadas profissões não é um bom principio.Se os médicos quiserem alterar o Estatuto podem faze-lo,mas parece-me que este assunto tem mais a ver com as eleições para a Ordem no próximo mes do que qualquer outro motivo

samuel disse...

Convinha talvez ter em conta que a Ordem dos Médicos é um organismo em que o estado delega competências de regulação de comportamentos que afectam a saúde pública, responsabilidade que lhe caberia...
Não é, portanto uma delegaçãozeca da "opus dei" nem um movimentozinho "pró-vida". Ou, não devia ser.

Anónimo disse...

Assim de repente atè parece que a ordem ,seus códigos e estatutos,nao teem que respeitar a lei portuguesa.